Lendas só sobrevivem se lembradas. Freddy Krueger está há décadas provando isso. Ao contrário de outros assassinos do cinema de terror, Candyman tem uma história de luta racial e, por isso, um significado muito mais relevante que o da maioria. Lançado na tela grande em 1992, saído das páginas de Clive Barker, o personagem volta a atacar. E a única recomendação possível é: assista a A Lenda de Candyman (Candyman, 2021).
Sem se definir exatamente como uma sequência ou um reboot, o novo filme revisita o universo iniciado em 92 de forma esperta o suficiente para afagar os fãs da franquia ao mesmo tempo em que agrada quem não sabia nada a respeito. Nesse episódio dos anos 90, uma estudante (vivida por Virginia Madsen) toma conhecimento da lenda urbana de um escravo que teria sido morto por ter se apaixonado pela filha do dono das terras. Segundo dizem, ele foi torturado, mutilado e queimado, e ainda recebeu mel no rosto para atrair picadas de abelhas.
Agora, em pleno 2021, um pintor (Yahya Abdul-Mateen II, de Os 7 de Chicago, 2020), tido como promissor, tenta voltar a pintar e começa a visitar um conjunto habitacional pobre há muito abandonado para ter ideias. Os moradores humildes foram retirados para darem lugar a construções mais modernas e caras, num claro exemplo do fenômeno da gentrificação. Mas o lugar guarda histórias que os veteranos de lá carregam, e uma delas é sobre um sujeito que dava balas para as crianças e acabou perseguido.
Dessa forma, a diretora e roteirista Nia DaCosta (de Passando dos Limites, 2018) apresenta a mitologia criada pelo escritor Clive Barker para novas gerações e aproveita para modernizá-la, atualizando a crítica social contida no material. E, porque não dizer, a roteirista (ao lado dos também produtores Jordan Peele e Win Rosenfeld) vai mais longe e amplia esse universo. A tensão segue num crescendo até deixar o público realmente incomodado. Abdul-Mateen II é muito habilidoso ao mostrar a espiral de loucura na qual seu personagem se encontra, com cenas que nos remetem a A Mosca (The Fly, 1986), quando a tragédia se anuncia. Teyonah Parris (de WandaVision) faz par com ele, outra grande atriz que tem muito a oferecer.
O diretor de fotografia John Guleserian (de Questão de Tempo, 2013) aproveita muito bem as paisagens urbanas que capta, com prédios, pichações e becos mal iluminados, chegando a causar uma certa claustrofobia no espectador – acentuada por uma trilha intimista de Robert Aiki Aubrey Lowe (de A Chegada, 2016). Apesar de trazer em destaque o nome do Midas atual Jordan Peele no cartaz, Candyman mostra que temos muito o que esperar da carreira da diretora Nia DaCosta. Peele chama público, mas é DaCosta que garante a qualidade do programa.
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