Papai Noel ganha uma versão rabugenta com Mel Gibson

Sempre tem aquele cinéfilo que, chegando o Natal, alega que Duro de Matar (Die Hard, 1988) é seu filme favorito ambientado nessa temporada. Ou mesmo o curta do Lobo de 2002, o Especial Paramilitar de Natal, no qual o Coelhinho da Páscoa encomenda a morte do bom velhinho. Pois 2020 trouxe outra opção que vai entrar nesse filão e deve agradar os fãs de ação: Entre Armas e Brinquedos (Fatman).

Longe do físico que deveria ter (e que o título original reforça), Mel Gibson (de Os Mercenários 3, 2014) é uma versão no mínimo inusitada do Papai Noel. Mal humorado e cansado de tantos anos de trabalho, ele lamenta o fato de tantas crianças no mundo serem malcriadas. Assim, elas não ganham presentes e o subsídio governamental que ele recebe diminui. Com uma verba cada vez menor, fica difícil manter a fábrica e os muitos funcionários trabalhando.

Essa é a premissa de Entre Armas e Brinquedos, título nacional ridículo para Fatman, disponível no Now. Na falta de brinquedos, Chris Cringle se vê obrigado a aceitar a proposta dos militares para produzir armas. E sua linha de produção é extremamente competente, o que leva a uma alta rentabilidade. Essas possíveis discussões sobre capitalismo, militarismo e belicismo nunca são desenvolvidas, apenas correm por fora. Uma vez apresentado o protagonista, conhecemos os demais personagens, que farão a trama andar.

Em outra cidade, entra em cena um garoto rico que tem vários ressentimentos. Ele vive com a avó, que o controla de perto, e não tem qualquer contato com os pais. Para piorar, ganha de Natal um pedaço de carvão – presente destinado às crianças ruins. Acostumado a ser o primeiro em tudo, ele chega a sequestrar e ameaçar a coleguinha que tem um projeto de ciências melhor do que o dele. Está explicado o pedaço de carvão.

Dando vazão à raiva que sente, Billy (Chance Hurstfield, de Bons Meninos, 2019) contrata um assassino profissional para eliminar Chris. O Magrelo, como o matador é conhecido, aceita a tarefa prontamente, tendo ele também seus ressentimentos com o gordo Cringle. Pelos apelidos, já percebemos que os dois estavam destinados a serem antagonistas. Walton Goggins (de Tomb Raider: A Origem, 2018) compõe um vilão metódico, focado, que nunca se desvia de seu alvo.

Temos, então, o quadro de Entre Armas e Brinquedos montado. O Papai Noel de Gibson é um pouco como o Batman de Ben Affleck: um sujeito desiludido, que vê as dificuldades de cumprir sua tarefa e segue lutando. Como se não tivesse problemas o suficiente, ainda precisa lidar com Billy, o Magrelo e os militares. Tudo isso numa fotografia gélida, num lugar não identificado que parece ser o Alasca. A natureza de Chris, que parece ter o fator de cura do Wolverine, nunca fica clara, sendo apenas um dos muitos pontos deixados sem explicação.

Com roteiro e direção dos desconhecidos irmãos Nelms, Eshom e Ian, o longa perde força na segunda metade e tem um final bobinho, não conseguindo corresponder à premissa interessante. Não deixa de ser uma diversão escapista para uma sessão da tarde. Quem gosta de uns tiros, brigas e explosões vai ficar bem satisfeito. E quem sabe esse não é um filme de origem e o Papai Noel vira uma franquia?

Esse é um Papai Noel como você nunca viu

Marcelo Seabra

Jornalista e especialista em História da Cultura e da Arte, é atualmente mestrando em Design na UEMG. Criador e editor de O Pipoqueiro, site com críticas e informações sobre cinema e séries, também tem matérias publicadas esporadicamente em outros sites, revistas e jornais. Foi redator e colunista do site Cinema em Cena por dois anos e colaborador de sites como O Binóculo, Cronópios e Cinema de Buteco, escrevendo sobre cultura em geral. Pode ser ouvido no Programa do Pipoqueiro, no Rock Master e nos arquivos do podcast da equipe do Cinema em Cena.

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