por Marcelo Seabra
“Fiquei sabendo que você pinta casas”. Assim teria começado a amizade entre Frank Sheeran e Jimmy Hoffa. Pintar casas, no jargão da época, significava matar, espirrar sangue nas paredes. Isso é o que Sheeran contou a seu biógrafo e a frase dá nome ao livro que serviu de fonte para O Irlandês (The Irishman, 2019), longa produzido pela Netflix já disponível no serviço. Se você precisa de um bom motivo para assisti-lo, aqui vão cinco: De Niro, Pacino, Pesci, Keitel e Scorsese. No mínimo.
Com um elenco fabuloso, Martin Scorsese conta a história de um homem que pode ser descrito como uma espécie de Forrest Gump da máfia. Ele parece estar envolvido em todos os eventos criminosos importantes das décadas de 60 a 80, inclusive o desaparecimento do líder sindical Jimmy Hoffa. É importante ressaltar que nada do que vemos é comprovadamente verdade, é a palavra de um criminoso. Nos papéis principais, dois dos melhores atores de todos os tempos: Robert De Niro vive Sheeran, enquanto Al Pacino empresta seus trejeitos a Hoffa. Eles já contracenaram juntos antes (no ótimo Fogo Contra Fogo, 1995, e no fraco As Duas Faces da Lei, 2008), mas este é certamente um ponto mais alto em suas carreiras.
Velho, debilitado e esquecido pela família em um asilo, Sheeran conta sua história para o advogado. Foi à guerra, onde teria matado pela primeira vez. Ao voltar, dirigir um caminhão não pagava o suficiente, e começou a fazer bicos não necessariamente legais. Foi quando conheceu um figurão da máfia, Russell Bufalino (Joe Pesci, colaborador frequente de Scorsese e de De Niro), e entrou para esse mundo. Foi logo apresentado a outro chefão, Angelo Bruno (Harvey Keitel), e ao presidente do sindicato dos caminhoneiros, Jimmy Hoffa. Sheeran, Bufalino e Hoffa são os pilares do longa, mas há vários personagens muito interessantes, assim como seus intérpretes.
Apesar da estranheza dos olhos claros e dos efeitos digitais rejuvenescedores, De Niro (acima) está em um grande momento. O personagem é de poucas palavras, dando a oportunidade ao ator de se expressar de várias formas. E como o seu olhar fala! Pacino (abaixo), conhecido por seus estouros e berros pausados, abusa desses recursos, somando vários outros para compor um quadro rico, desmistificando Hoffa, que teria tomado parte em muita coisa errada. Pesci, como “a voz da sabedoria”, dá sempre a impressão de uma falsa calma, com um vulcão interior pronto a irromper.
O roteiro de Steven Zaillian (de Êxodo, 2014) não é curto, mas é enxuto. Ele aproveita a maioria dos acontecimentos narrados no livro de Charles Brandt e a montagem de Thelma Schoonmaker, brilhante como de costume, dá agilidade suficiente para que as três horas e meia de exibição passem rapidamente. A câmera de Rodrigo Prieto nos dá informações importantes apenas com seus enquadramentos, dispensando diálogos. Há um momento específico, por exemplo, em que a câmera se afasta, deixando um personagem pequeno e “preso” numa espécie de moldura.
Scorsese costuma voltar aos mesmos colaboradores – como Schoonmaker, que trabalha com ele desde 1967. Robbie Robertson, que assina a trilha, é ex-membro da Band, protagonistas de O Último Concerto de Rock (The Last Waltz, 1978), e o músico ainda produziu o longa. Essa familiaridade deve tornar o trabalho mais fácil, simplesmente não conseguimos achar nada fora do lugar.
Além dos tiros, assassinatos e intrigas, O Irlandês fala também de lealdade, de família, de temas caros a mafiosos. Apesar de serem brutamontes violentos, Scorsese vai fundo na mente deles, abordando até a incapacidade de comunicação e de demonstrar afeto, o que mantém uma filha afastada de seu pai. O diretor tem uma carreira variada, com dramas históricos, comédias, documentários. Mas ninguém é melhor ao contar uma história como essa.
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Já assisti o filme. Realmente é fantástico. Uma obra da arte cinematográfica feita por toda equipe do Martin Scorcese.
O melhor filme que assisti nos últimos anos(Tenho 67)!!!
Muito boa resenha! Filme extraordinário!
Excelente resenha!