por Marcelo Seabra
Muito mais próximo do drama que da ficção-científica, A Gente Se Vê Ontem (See You Yesterday, 2019) é uma nova produção Netflix que traz ar fresco a um subgênero bem famoso: o das viagens no tempo. Com um elenco jovem que ainda vai chamar muita atenção, o longa marca a estreia do estudante de Cinema Stefon Bristol na direção, depois de realizar curtas e colaborar com outros nomes, dentre os quais se destaca o de Spike Lee.
Bristol diz que seus filmes favoritos são Faça a Coisa Certa (Do the Right Thing, 1989) e De Volta Para o Futuro (Back to the Future, 1985). Por isso, não é por acidente que A Gente Se Vê Ontem parece ser a mistura deles, trazendo conceitos ligados a espaço e tempo numa mistura interessante com temas como racismo e violência policial. Para que a referência fique ainda mais clara, temos uma participação mais do que especial logo no início da obra.
Novamente vivendo os papéis do curta homônimo de 2017, Eden Duncan-Smith e Dante Crichlow têm a chance de desenvolverem as aventuras de CJ Walker e Sebastian. Eles são melhores amigos que passam o tempo fora da escola desenvolvendo pesquisas científicas para vencerem uma importante competição e ganharem bolsas de estudo em institutos renomados. No centro da pesquisa da dupla está a possibilidade de viajar no tempo, e eles já fizeram mais de cem testes quando os conhecemos.
Uma atitude acertada, que outros filmes recentes também tiveram, é não se aprofundar muito nas teorias científicas, mas usá-las como ponto de partida para algo muito mais profundo. Bristol e sua co-roteirista, Fredrica Bailey, estão mais interessados em enfocar o círculo de violência que envolve as populações negras nos Estados Unidos, algo que segue na linha do mentor de Bristol, ninguém menos que Spike Lee (diretor e roteirista de Faça a Coisa Certa). Lee, inclusive, é produtor do longa.
Desenvolvendo as ideias que apresentaram no curta, a dupla faz com que CJ e Sebastian consigam voltar no tempo e, frente a uma tragédia, contemplem a possibilidade de mudar os rumos da história. É interessante perceber que o passado – e as questões que ele levanta – se torna um caminho bem mais atrativo que o futuro. Nos preocupamos mais com o que conhecemos, e não com o que ainda não aconteceu. E, assim, nos vemos torcendo pelos amigos, e o clima do filme, que começou bem-humorado, vai ficando tenso, em rumos que são de fato surpreendentes.
Nesse desenvolvimento, há pontos negativos a se levantar. O caldo entorna quando não se respeita as regras criadas. Como o roteiro obviamente segue os conceitos apresentados em De Volta para o Futuro, percebemos falhas gritantes. Para não entrar em detalhes, cito apenas um folheto e um velório como pontos principais. Se um não faz muita diferença, o outro é essencial para a trama. Fica parecendo que os realizadores não encontraram outra forma de chegar onde precisavam e precisaram fazer vista grossa para algo que qualquer fã de Marty McFly sabe há anos.
As situações que envolvem viagens no tempo ocupam o Cinema e a TV há anos, e é claro que não há uma resposta definitiva. Vingadores: Ultimato (Avengers: Endgame, 2019) trouxe outra vertente que foge um pouco, mas a mais difundida acaba sendo a do Efeito Borboleta. A Gente Se Vê Ontem segue por aí até dar uma grande derrapada. E nos leva a um final que pode ser facilmente interpretado como preguiçoso. Há um conceito por trás, claro, mas ele pode não satisfazer a todos.
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