por Marcelo Seabra
Nota: o texto a seguir foi escrito para uma disciplina de faculdade em 2004 e é republicado aqui na ocasião do aniversário de 71 anos de Stephen King. Algumas informações estão desatualizadas, nada foi alterado, mas serve como uma visão geral sobre as adaptações da obra do escritor. Parabéns, Mestre, e obrigado!
Um carcereiro descobre um poder fantástico nas mãos de um prisioneiro prestes a ser executado, mas não consegue provar a inocência dele. Um banqueiro é preso pelo assassinato de sua esposa e do amante dela e passa anos na cadeia, se envolvendo com diversos personagens. Quem imaginaria que estas histórias saíram da cabeça do homem conhecido como Mestre do Terror? Pois Stephen King não se limita a apenas um gênero, qualquer que seja ele.
O cinema parece sempre ser regido por modismos, que podem ser adaptações de quadrinhos, séries de televisão ou obras literárias. Analisando-se este último, pode-se constatar que várias obras de Stephen King estão sendo desenvolvidas para o cinema. Algumas, em estágio avançado; outras, nem tanto. E os produtores sabem que o autor é garantia de retorno financeiro, seu nome no cartaz é um grande atrativo.
King dedica-se ao ofício desde os 12, mas passou por diversos trabalhos quando as coisas iam mal. Abandonada pelo marido em 1949, Nellie Ruth teve que criar, sozinha, seus dois filhos: Stephen, então com dois anos, e David, com quatro. Exerceu várias funções que não exigiam especialização ou estudo, como em uma lavanderia, restaurantes, até como governanta. Em 1967, o jovem escritor conseguiu vender seu primeiro conto para uma revista, e ficou tentando conseguir algo mais.
Depois que, em 1971, se casou, King não conseguia emprego como professor de inglês e teve que colocar seu diploma de lado, conseguindo salários baixos como frentista de posto de gasolina, por exemplo. Sua esposa, Tabitha, foi pelo mesmo caminho que a sogra, produzindo rosquinhas ou passando lençóis em fábricas. As publicações esporádicas não rendiam o suficiente e a família King teve até que pedir o cancelamento de sua linha telefônica.
Foi apenas aos 26 anos que King conseguiu contrato para uma editora publicar um livro seu, de capa dura. Era Carrie, história que havia passado por várias recusas e tinha até ido, literalmente, para o lixo. Tabitha o resgatou e insistiu para que o marido reescrevesse e apresentasse novamente. Uma crítica favorável do jornal The New York Times chamou atenção para o escritor, e os direitos de adaptação de Carrie foram vendidos ao estúdio United Artists.
O filme rendeu uma boa bilheteria e elogios ao diretor Brian De Palma. “Para muitos produtores e diretores, o material que escrevo é muito visual. Eles resolvem filmá-lo achando que não precisam trabalhar duro na construção dos filmes”, sugere King em entrevista à revista SET. O problema, segundo ele, é que as produções focam muito o “momento em que o monstro aparece movimentando suas presas”, não dando muita importância à história.
Vieram, em seguida, outros dois sucessos, também adaptados: A Hora do Vampiro, para a televisão, e O Iluminado, pelas mãos de Stanley Kubrick. Uma curiosidade é o fato de o escritor gostar de fazer aparições à Hitchcock nos filmes baseados em sua obra. Creepshow – Show de Horrores, Cemitério Maldito, A Maldição do Cigano trazem algumas das mais significativas, que fazem os fãs procurá-lo em cena.
Com o nome já consolidado e superexposto, King achou que era hora de publicar histórias diferentes, que pudessem fugir do habitual, que ele queria que chegasse ao seu público. Mas, para evitar mais lançamentos sob sua grife e gozar da liberdade de um desconhecido, ele adotou o pseudônimo Richard Bachman, inventando uma história para este personagem, incluindo uma esposa e até seu falecimento, que ocorreu quando o segredo foi exposto. Com essa alcunha, ele publicou cinco livros “vivo” e um “póstumo”. Uma dessas histórias, de Os Livros de Bachman, deu origem ao filme O Sobrevivente, estrelado por Schwarzenegger e exibido à exaustão na televisão.
Mas as histórias geralmente apontadas pela crítica como as melhores são aquelas que se aproximam mais da realidade, mesmo que apresentem algo incomum, como em A Zona Morta, cujo protagonista passa a prever o futuro após ficar alguns anos em coma. Bryan Singer, por exemplo, dirigiu O Aprendiz antes de entrar para a franquia X-Men. Ou como as histórias citadas no início deste texto, que deram origem aos filmes À Espera de um Milagre e Um Sonho de Liberdade, respectivamente. Segundo o crítico de cinema Pablo Villaça, este último deve se tornar um clássico, com o tempo, ao lado de Casablanca, Cantando na Chuva ou Cidadão Kane.
Já milionário, vivendo em uma mansão vitoriana de 24 cômodos, King continua morando no estado americano do Maine. Muitas de suas histórias, inclusive, se passam lá, em uma cidade inventada. É em Castle Rock que o xerife Alan Pangborn enfrenta o diabo em Trocas Macabras, ou o escritor Thad Beaumont confronta George Stark, sua Metade Negra, por exemplo. Por isso, concorda quando o chamam de regionalista: “Se você viveu toda a sua vida em um lugar e quer escrever a sério, você é quase que obrigado a escrever sobre aquele lugar. Pode-se descobrir fatores universais em qualquer lugar. Mas me afasto de lá de vez em quando”, explica, em uma das várias entrevistas publicadas no livro Dissecando Stephen King. Um de seus dramas mais sensíveis, O Corpo, que deu origem ao filme Conta Comigo, também se passa lá.
Recuperado do acidente de setembro de 1999, quando foi atropelado durante uma caminhada e teve vários ossos quebrados, e de uma pneumonia bem séria no fim de 2003, o escritor mantém sua rotina de trabalho, datilografando algo em torno de duas mil palavras todas as manhãs, ao som de rock. E continua com medo de escuro, mantendo alguma luz de seu quarto acesa durante a noite.
Em pré-produção estão outros vários projetos. O Cadillac de Dolan, primeiro conto do livro Pesadelos e Paisagens Noturnas, já teve vários atores ligados a seu elenco. Atualmente, conta com Christian Slater (Entrevista com o Vampiro) e Wes Bentley (Beleza Americana) nos papéis principais (abaixo). Escrito a quatro mãos, O Talismã é outro a ganhar vida. Marca a amizade entre King e Peter Straub, autor que também frequenta um mundo da fantasia. A dupla já, inclusive, escreveu a sequência, A Casa Negra. A lista ainda inclui um novo Creepshow, Saco de Ossos e Buick 8.
Além desses longas, várias redes americanas de televisão usam as criações do autor para preencherem suas grades de programação, geralmente apresentando, em horário nobre, minisséries com a grife Stephen King. E, já de olho em um lucro extra, elas são compiladas em edições menores, para conquistarem o mercado do vídeo e DVD. Foi assim com A Dança da Morte, O Iluminado (a segunda versão), Jovem Outra Vez, Fenda no Tempo, Rose Red, A Tempestade do Século e o mais recente Desespero. Em 2004, a rede ABC exibiu Kingdom Hospital, série que conta com roteiro do escritor, desenvolvido especialmente para a televisão.
O mais recente longa adaptado da obra de King é O Nevoeiro, conduzido pelo mesmo diretor de Um Sonho de Liberdade e À Espera de Um Milagre, Frank Darabont. Como aconteceu em ambos, William Sadler e Jeffrey DeMunn estão no elenco, que chega reforçado por outros velhos conhecidos das histórias do escritor: Thomas Jane (O Apanhador de Sonhos), Andre Braugher (Salem’s Lot) e Frances Sternhagen (Jovem Outra Vez). Dessa vez, Darabont se envolve com criaturas sobrenaturais, adentrando mais o terror que seu habitual. Mas, apesar dos monstros e sustos, temos interessantes discussões acerca da humanidade, ainda que os personagens sejam menos desenvolvidos, mais estereotipados, parecendo servir apenas para que a história chegue onde se espera. Nada que impeça o longa de ser divertido e digno de ser assistido.
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