Mais um autor infantil ganha cinebio

por Marcelo Seabra

É muito comum que comecem a produzir determinado longa e logo outro estúdio resolva partir para um projeto semelhante. É o que aconteceu, de uma forma ou de outra, com o ursinho Puff – que passou a ser chamado no Brasil de Pooh, mais próximo de seu nome original, Winnie the Pooh. Antes do filme atualmente em cartaz, estrelado por Ewan McGregor, tivemos o lançamento de Adeus Christopher Robin (Goodbye Christopher Robin, 2017), uma bela obra que não teve o destaque merecido.

Christopher Robin, que está no título das duas produções, era o filho de um escritor de certo renome em Londres e, apesar da pouca idade, se tornou uma celebridade. Isso, porque o pai, sofrendo de um bloqueio criativo e de traumas de guerra, começa a escrever sobre os prazerosos dias que passa com o garoto no bosque perto de casa, onde levam uns animais de pelúcia e inventam aventuras. Naquele período, após a Primeira Guerra Mundial, tudo o que as pessoas queriam era um alívio da realidade.

Acertando em cheio no momento, Alan Milne (Domhnall Gleeson, de Star Wars: Os Últimos Jedi, 2017) vende milhares de cópias das histórias do ursinho e seu amigo humano, Christopher Robin. O garoto (vivido pelo ótimo iniciante Will Tilston) fica muito famoso, mais até que o pai, e esse é um dos aspectos tratados no filme: o status de celebridade. O distanciamento emocional de Alan também é um ponto importante, além do claro despreparo para enfrentar a maternidade de sua esposa (Margot Robbie, de Eu, Tonya, 2017).

O roteiro, assinado por Frank Cottrell Boyce e Simon Vaughan, faz um bom trabalho se aprofundando na psiquê de Alan, nos apresentando a um sujeito acostumado a fazer os outros rirem através de suas populares peças que perde a motivação ao passar pelos horrores da guerra. Gleeson faz um ótimo trabalho com seu corpo e sua presença, demonstrando perfeitamente o que se passa dentro do sujeito. Sua relutância em demonstrar seus sentimentos são de partir o coração. Enquanto isso, Robbie vive a megera de plantão, com poucos lampejos de humanidade.

O jovem Tilston é quem rouba a cena quando aparece, extremamente expressivo, ainda mais para alguém tão novo. Suas interações com a babá são ótimas, exemplificando de forma acertada como são as reações de uma criança. Cabe aí outro elogio: Kelly Macdonald (de Trainspotting 2, 2017) também está muito bem como a babá, Olive. É uma mulher que devotou sua vida a servir e faz vista grossa para comportamentos que não compreende e nem pode, mas não deve interferir.

Durante a sessão de Adeus Christopher Robin, é fácil se lembrar de Em Busca da Terra do Nunca (Finding Neverland, 2004), outra produção sobre um escritor emocionalmente travado que cria um clássico da literatura infantil a partir da amizade com uma criança. James Barrie é até citado em um diálogo. O fato de ter a história ambientada na primeira metade do século XX é outra semelhança, com seus figurinos escolhidos a dedo e sua fotografia que realça os padrões da época. Esse seria o momento de usar um “mas”. Mas a verdade é que quem gostou de um filme muito provavelmente vai se encantar pelo outro também.

Montagem para comparação

Marcelo Seabra

Jornalista e especialista em História da Cultura e da Arte, é mestre em Design na UEMG com uma pesquisa sobre a criação de Gotham City nos filmes do Batman. Criador e editor de O Pipoqueiro, site com críticas e informações sobre cinema e séries, também tem matérias publicadas esporadicamente em outros sites, revistas e jornais. Foi redator e colunista do site Cinema em Cena por dois anos e colaborador de sites como O Binóculo, Cronópios e Cinema de Buteco, escrevendo sobre cultura em geral. Pode ser ouvido no Programa do Pipoqueiro, no Rock Master e nos arquivos do podcast da equipe do Cinema em Cena.

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