por Marcelo Seabra
Ainda lembrado por Dois Filhos de Francisco (2005), Silveira parece sempre interessado em personagens genuinamente brasileiros, como o famoso cantor Luís Gonzaga (de Gonzaga: De Pai para Filho, 2012) ou o anônimo motorista de caminhão de À Beira do Caminho (2012). Agora, é a vez de duas meninas nordestinas, competentes e bem educadas costureiras que nos revelam algumas contradições e preconceitos do país. Dos tais homens de bem. Nos papéis principais, Marjorie Estiano (de O Tempo e o Vento, 2013) e Nanda Costa (de Gonzaga) são mulheres fortes, que carregam bem o roteiro de Patrícia Andrade, habitual colaboradora do diretor.
De um lado, temos um líder de cangaceiros bem romantizado, um cavalheiro (vivido por Júlio Machado, de Não Pare na Pista, 2014). Injustiçado pela vida, ele foi forçado pelo destino a pegar em armas. Um pouco forçado, sim, mas ainda é um núcleo interessante, que ajuda a desmistificar essas figuras. Do outro lado, temos a alta classe recifense representada por um rico patriarca (Cláudio Jaborandy, de Gonzaga) e sua esposa (Rita Assemany, de Abril Despedaçado, 2001). O Dr. Duarte acredita piamente na frenologia, pseudociência que foi desacreditada no século XIX. Ele era uma referência de cultura e autoridade para seus pares, mesmo com esse pensamento extremamente atrasado. E Dona Dulce só se preocupava com o que os outros iriam falar, vivendo de aparências e convenções.
Baseado no livro A Costureira e o Cangaceiro, da pernambucana radicada nos Estados Unidos Frances de Pontes Peebles, o filme tem uma cara de romance definitivo de uma região, bem como é O Tempo e o Vento para o Rio Grande do Sul. Mas suas questões são bem atuais, não ficando apenas na formação de um povo. Um exemplo claro desse frescor é a sugestão de uma cura gay, algo que parecia relegado ao início do século passado, e é encontrado nos jornais de hoje. Luzia e Emília são dois exemplos que podemos chamar de mulheres empoderadas, que fazem seus próprios destinos, procurando um par para somar, e não para protegê-las ou dominá-las.
A sessão de Entre Irmãs é longa, com suas duas horas e quarenta minutos. Mas não chega a cansar. Silveira costura bem belas imagens, tanto no campo quanto na cidade, uma trilha sonora discreta e um bom elenco – além dos citados, vemos em cena Letícia Colin (do novo Saltimbancos Trapalhões, 2017), Fábio Lago (de Operações Especiais, 2015), Rômulo Estrela (de Depois de Tudo, 2015) e Ângelo Antônio, o tal Francisco que tinha dois filhos. É sempre bom ver uma obra feita com capricho que dá os holofotes a mulheres tridimensionais. Ainda mais quando, até hoje, o corretor do Word não reconhece a palavra “empoderada”.
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