Ao Cair da Noite mantém alta a tensão

por Marcelo Seabra

Alguma coisa aconteceu, não sabemos o que é. Uma família se refugiou numa casa numa floresta, não sabemos onde fica. O que sabemos é que, o que quer que esteja acontecendo, é mortal. E não será fácil sobreviver. Se a premissa não é das mais originais, a condução e o resultado são e garantem a satisfação do público. Ao Cair da Noite (It Comes at Night, 2017) é uma ótima surpresa num gênero que passa longe do gol com tanta frequência que cria certa desconfiança.

Todos os anos, temos observado alguns destaques isolados entre filmes de terror, aqueles que fazem com que conservemos a nossa fé nesse filão. Depois de The Babadook (2014), Corrente do Mal (It Follows, 2014) e A Bruxa (The Witch, 2015), parecia que o destaque seguinte seria o pouco criativo Corra (Get Out, 2016), sucesso absoluto de bilheteria e crítica que faz uma grande mistura de referências e não atinge uma identidade própria. Mas eis que o diretor e roteirista Trey Edward Shults, seguindo seu elogiado Krisha (2015), emenda outro grato petardo.

Quem tem um animal de estimação e já o viu fitando a escuridão compenetradamente sabe o pânico que isso pode causar. E é exatamente essa sensação que o cartaz do filme traz. Não sabemos o que ele está vendo, mas é melhor que fique longe. E essa tensão permanece por toda a sessão, com a opressão dos quartos sendo tão explorada pela fotografia quanto a vastidão da mata. Não importa onde você estiver, o perigo está próximo, esperando apenas uma derrapada. E é por isso que a família toma muito cuidado com qualquer movimento, sempre de luvas e máscaras.

Com poucos minutos de projeção, percebemos que esse não será um terror habitual. A dedicação aos personagens é algo que não se vê sempre. Não conhecemos bem o histórico deles, mas logo entendemos as relações e o carinho entre eles. O pai, a mãe e o filho vivem em uma rotina bem controlada, a melhor forma de evitar problemas. Todos imaginam o que pode vir a acontecer, mas é melhor se concentrar nas pequenas coisas do dia a dia do que pensar no pior. As interpretações seguras de Joel Edgerton (de O Presente, 2015), Carmen Ejogo (de Alien: Covenant, 2017) e Kevin Harrison Jr. (de O Nascimento de Uma Nação, 2016) se encaixam perfeitamente, dando muita vida a seus personagens.

Em pouco menos de uma hora e meia, Shults constrói uma atmosfera que poucos diretores conseguem e deixa uma impressão forte e duradoura. De forma enxuta e direta, ele segue uma das mais antigas recomendações quando o assunto é o Cinema de terror: menos é mais. Quanto menos o público vê, mais aterrorizado fica. Com a ajuda de uma trilha sonora comedida e pontual, melhor ainda. Não surpreenderia que o universo de Ao Cair da Noite desse origem a uma série interminável de filmes para a televisão. Afinal, ele deixa esse gosto por mais.

Todo cuidado é pouco

Marcelo Seabra

Jornalista e especialista em História da Cultura e da Arte, é mestre em Design na UEMG com uma pesquisa sobre a criação de Gotham City nos filmes do Batman. Criador e editor de O Pipoqueiro, site com críticas e informações sobre cinema e séries, também tem matérias publicadas esporadicamente em outros sites, revistas e jornais. Foi redator e colunista do site Cinema em Cena por dois anos e colaborador de sites como O Binóculo, Cronópios e Cinema de Buteco, escrevendo sobre cultura em geral. Pode ser ouvido no Programa do Pipoqueiro, no Rock Master e nos arquivos do podcast da equipe do Cinema em Cena.

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  • Se você não sabe o que assistir neste Halloween eu recomendo Ao Cair da Noite Cair da Noite fala muito mais sobre nossos medos internos e transborda tópicos como paranoia, experimentando a forma como lidamos e convivemos sob circunstâncias extremas. O mal pode existir e estar lá fora, mas permeia todos nós, se mostrando muito mais perigoso e urgente quando é deflagrado de dentro para fora. Eu estou grata. ? Ao cair da noite ainda me dá medo do escuro ????

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