por Marcelo Seabra
À primeira vista, Tudo e Todas as Coisas (Everything, Everything, 2017) parece ser um romance adolescente corriqueiro. E ele até começa assim, conquistando pela riqueza dos recursos que utiliza para contar a história. Mas, à medida em que as coisas caminham, ele deixa de ser plausível e suas inconsistências vão aparecendo. Ao final, temos a prova de que apenas o carisma dos atores não segura um filme com tantos buracos.
Na trama, conhecemos uma garota que comemora seus 18 anos tendo vivido sempre dentro de uma casa esterilizada, sob os cuidados da mãe e de uma enfermeira. Ela sofre de uma doença imunológica rara e nunca sai ou tem contato físico com outra pessoa. “Mas a mãe a abraça e beija”, você pode apontar. “Por que a mãe e a enfermeira podem entrar, e mais ninguém?”, é uma pergunta que pode surgir. Na verdade, a parte do “mais ninguém” é imprecisa: a filha da enfermeira também pode. Teriam todas passado por exames? Ou recebido vacinas? Vai saber.
A vida da menina sai da mesmice de escrever resenhas literárias (cheias de spoilers) e de fazer um curso à distância de arquitetura (com direito a maquetes) quando vê o novo vizinho. Alguém poderia se levantar contra a ideia de que é preciso um homem para mudar a vida de uma mulher. Para evitar controvérsias, digamos que o catalisador da mudança foi o amor, mesmo que à primeira vista. Mas eis que surge a dúvida: “O material para as maquetes é esterilizado? A cola não causa reações?”. A mãe recusa um bolo de política da boa vizinhança exatamente por causa da segurança da filha, mas todo o resto pode entrar. E há um novo conceito de cartão de crédito: basta pedir um pela internet e fazer compras, os boletos nunca vão chegar.
Como dá para perceber, as inconsistências são várias e vão se multiplicando, cada vez mais rápido. Ao chegar ao final, o público deve se perguntar como foi possível chegar tão longe. “Será que ninguém viu a bagunça?” Se o roteiro fosse uma estrada, a suspensão do carro já teria quebrado há tempos. Cortesia do roteirista de filmes melosos como A Incrível História de Adaline (2015) e O Melhor de Mim (2014), J. Mills Goodloe. Mas sejamos justos: o livro que deu origem ao filme, de Nicola Yoon, não deve ser grandes coisas. Consegue ser bem pior que A Culpa É das Estrelas (The Fault in Our Stars, 2014), obra bem similar em tema, forma e até no ator principal.
Vivendo Maddy, Amandla Stenberg mostra que cresceu bastante desde os tempos de Jogos Vorazes (The Hunger Games, 2012). Apesar de parecer que se embolou em alguns diálogos, ela segura bem a peteca, e a química funciona com Nick Robinson (de Jurassic World, 2015), o que é fundamental para aguentar a sessão – mesmo o filme tendo apenas uma hora e meia de duração. Anika Noni Rose (de Bates Motel), como a mãe de Maddy, faz milagres para tornar a personagem menos antipática, e muito é exigido dela mais adiante.
As situações que se desenrolam a partir do meio e principalmente no final não serão discutidas para evitar spoilers (o que Maddy não faz em seus textos). Basta dizer que é bem sem pé nem cabeça e as reações esperadas não aparecem. A diretora Stella Meghie emprega bastante criatividade, esperando que isso sirva para costurar os retalhos. Recursos como o astronauta e as conversas dramatizadas são interessantes, mas um pingo em um oceano de conveniências e absurdos.
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