Rei Arthur ganha mais uma versão no Cinema

por Marcelo Seabra

É impressionante o número de obras que recontam as lendas de Arthur Pendragon e seus cavaleiros. E, até por isso, cada nova tentativa toma uma outra liberdade buscando fazer algo novo, inédito. Nessa linha de aberrações, chega aos cinemas Rei Arthur: A Lenda da Espada (King Arthur: Legend of the Sword, 2017), que poderia se chamar Arthur Origens, ou A História Não Contada de Arthur. Ou seja: várias novidades numa história que já é conhecida, deturpando-a até que não consigamos mais reconhecer o protagonista.

Com os relatos de Sir Thomas Malory, do século XV, é possível saber quem realmente foi Arthur e o que ele fez. Mas a história mais conhecida envolve elementos sobrenaturais, como um mago que ajudava a turma e uma espada que só respondia ao dono. Dessa versão, surgiu Excalibur (1981), um novo clássico tido como definitivo quando o assunto é Arthur. Um elenco e equipe ingleses contando a saga do maior rei que a Inglaterra já teve.

Parece que Guy Ritchie e seu parceiro habitual, o produtor e roteirista Lionel Wigram, não ficaram satisfeitos com Excalibur e partiram para uma nova tomada da história. E a ideia é a mesma por trás do Sherlock Holmes da dupla: tornar o personagem mais humano, aproximando-o do povo, e reforçando o aspecto físico, para que não faltem lutas. E os mesmos maneirismos de filmagem: cortes rápidos, câmera bem próxima da ação, dramatização do planejamento da ação e um humor descolado. É impossível não pensar em Holmes durante a sessão, ou mesmo nos longas anteriores de Ritchie, como Rock’n’Rolla (2008).

No papel principal, Charlie Hunnan mais uma vez mostra que é carismático (como em Círculo de Fogo, 2013, ou em Sons of Anarchy), e segura bem a responsabilidade de viver Arthur. Mas o roteiro inventa tanta moda que fica difícil acompanhar a trama com seriedade. Não conhecer os fatos em torno de Arthur e a carreira de Ritchie pode ajudar, já que ao menos o que é mostrado soa inédito e consegue ser divertido. Mas não deixa de ser algo muito inspirado em O Senhor dos Anéis, Game of Thrones e similares, o que o torna genérico e mais pobre.

Pouco se sabe, historicamente, sobre Vortigern, o vilão vivido por Jude Law (também de Sherlock). Mas nada bate com o que vemos na tela, propositalmente exagerado para criar um antagonista à altura. Law tenta trazer um toque shakespeariano, mas cai nas mesmas armadilhas que pegam Hunnan. O restante do elenco, que inclui Djimon Hounsou, Eric Bana, Aidan Gillen, Annabelle Wallis e a espanhola Astrid Bergès-Frisbey, também não foge à regra do roteiro simplista.

Com O Agente da U.N.C.L.E. (The Man From U.N.C.L.E., 2015), Ritchie conseguiu fazer algo diferente de seu habitual. Se não deixou uma marca, um estilo, ao menos não estragou o resultado. Esse Rei Arthur é muito Sherlock Holmes para ter vida própria, e não tem identidade. É apenas uma fábula sobre um futuro rei que precisa cavar seu caminho em meio a desafios previsíveis e formulaicos.

A Maga (Bergès-Frisbey) ajuda os personagens, e nem sinal de Merlin

Marcelo Seabra

Jornalista e especialista em História da Cultura e da Arte, é mestre em Design na UEMG com uma pesquisa sobre a criação de Gotham City nos filmes do Batman. Criador e editor de O Pipoqueiro, site com críticas e informações sobre cinema e séries, também tem matérias publicadas esporadicamente em outros sites, revistas e jornais. Foi redator e colunista do site Cinema em Cena por dois anos e colaborador de sites como O Binóculo, Cronópios e Cinema de Buteco, escrevendo sobre cultura em geral. Pode ser ouvido no Programa do Pipoqueiro, no Rock Master e nos arquivos do podcast da equipe do Cinema em Cena.

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