Deuses Americanos adapta obra de Neil Gaiman

por Rodrigo “Piolho” Monteiro

Seria o homem uma criação dos deuses ou seriam os deuses uma criação do homem? Essa pergunta, que atormenta filósofos há séculos, tem uma resposta bem simples na visão do escritor Neil Gaiman. Não só os deuses são produtos da imaginação – e, principalmente, da fé – humana, como tendemos a carregá-los conosco onde quer que vamos. Em pouquíssimas palavras, essa é a premissa básica de Deuses Americanos (American Gods), adaptação do livro homônimo de Gaiman lançado em 2001 que estreou no último domingo nos EUA no canal Starz e, no dia seguinte, no Brasil, através do serviço de streaming da Amazon, o Amazon Prime Video.

Adaptado para a telinha por Bryan Fuller (de Hannibal) e Michael Green (de Heroes), Deuses Americanos começa com uma sequência pra lá de violenta para mostrar, de cara, que os Estados Unidos são um país que foi construído em cima de bastante sangue derramado. Não só isso, estabelece de início que aquele também é um país de imigrantes, tanto humanos quanto divinos, algo que diversos comentaristas já consideram como uma cutucada ao atual presidente e sua política com relação aos imigrantes. Politicagens à parte, nesse universo, sim, deuses não só existem como caminham entre nós. Não só isso, como novos deuses são criados a cada dia, na medida em que as pessoas colocam sua fé em coisas como a tecnologia e a mídia, o que deixa os antigos deuses cada vez mais fracos.

A série começa quando Shadow Moon (Ricky Whittle, de séries como The 100 e Mistresses – acima), condenado a seis anos de prisão, está prestes a conseguir sua condicional. Em três dias, Shadow estará livre. Sua liberdade, no entanto, acaba sendo antecipada já que sua esposa, Laura (Emily Browning, de Lendas do Crime, 2015), é morta em um acidente de carro. O mesmo acidente acaba por vitimar Robbie (Dane Cook), melhor amigo de Shadow, que lhe havia prometido um emprego.

No voo para casa, Shadow é abordado pelo fanfarrão Sr. Wednesday (Ian McShane, de Hércules, 2014), que lhe oferece um emprego de assistente pessoal. Wednesday parece saber mais sobre a vida de Shadow do que poderia e isso deixa o sujeito bastante irritado, de forma a recusar repetidamente a proposta do velho. Shadow acaba mudando de ideia e rapidamente sua vida se torna uma sucessão de situações surreais, que só tendem a se suceder mais rapidamente enquanto fica mais tempo na companhia de Wednesday.

O primeiro episódio de Deuses Americanos traz a assinatura tanto do Starz, canal que sabe como poucos estilizar cenas de violência (Spartacus era uma produção do canal), quanto de Fuller, que retrata essas situações com uma fotografia e composição de cena que as tornam quase singelas. Já o elenco traz boas performances, especialmente McShane, que interpreta Wednesday de maneira que retrata com perfeição a essência do personagem, e não deixa dúvidas para aqueles que conhecem um pouco de mitologia que ele representa. O resto do elenco de apoio cumpre seus papéis de maneira competente, com destaque para Pablo Schreiber (de 13 Horas: Os Soldados Secretos de Benghazi, 2016), que traz a dose certa de afetação para seu Mad Sweeney.

Deuses Americanos teve um começo promissor e, adaptações necessárias à parte, fez jus ao livro do qual foi adaptado. É, no entanto, uma série que pode causar estranheza aos mais desavisados e esperamos que isso não leve a um cancelamento precoce já que, segundo uma declaração recente de Gaiman, há planos de que ela dure cinco temporadas. A primeira, com 8 episódios, cobre apenas as 100 primeiras páginas da publicação.

McShane é sempre uma figura interessante

Marcelo Seabra

Jornalista e especialista em História da Cultura e da Arte, é mestre em Design na UEMG com uma pesquisa sobre a criação de Gotham City nos filmes do Batman. Criador e editor de O Pipoqueiro, site com críticas e informações sobre cinema e séries, também tem matérias publicadas esporadicamente em outros sites, revistas e jornais. Foi redator e colunista do site Cinema em Cena por dois anos e colaborador de sites como O Binóculo, Cronópios e Cinema de Buteco, escrevendo sobre cultura em geral. Pode ser ouvido no Programa do Pipoqueiro, no Rock Master e nos arquivos do podcast da equipe do Cinema em Cena.

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