Garoto cresce Sob a Luz do Luar

por Marcelo Seabra

A vida de todo mundo daria um filme. Uns seriam mais interessantes que outros, claro. Essa é a conclusão que fica ao final da sessão de Moonlight: Sob a Luz do Luar (2016). O longa, badalado na temporada de premiações e que já acumula algumas estatuetas, acompanha um garoto enquanto ele cresce em meio às dificuldades da vida pobre no sul da Flórida. O fato de ser realizado prioritariamente por negros traz mais verdade às situações, mas o acúmulo de temas tumultua, enquanto a falta de reação do protagonista pode cansar o espectador.

Vivido por três atores em momentos diferentes da vida (Alex Hibbert, Ashton Sanders e Trevante Rhodes), Chiron é filho de uma mãe viciada (Naomie Harris, de 007 Contra Spectre, 2016) e pai desconhecido. Um dia, sem razão alguma, ele aceita a companhia de um desconhecido (Mahershala Ali, de Estrelas Além do Tempo, 2016 – abaixo) e vai comer com ele. O tal sujeito acaba se tornando a figura paterna que faltava, e se mostra carinhoso e compreensivo com o menino. É interessante notar que Paula, numa ótima atuação de Harris, é uma vítima por ser drogada, mas maltrata o filho tanto que ele prefere ficar fora de casa. Já Juan, o pai postiço, é o traficante que fornece para Paula e ajuda a dificultar o ambiente domiciliar dela, provendo ao garoto um muito melhor – com a namorada, Teresa (Janelle Monáe, também de Estrelas). Nada premeditado, mas está tudo conectado e os papéis, invertidos.

Crescendo em meio a essa situação, a mãe de um lado, Juan e Teresa de outro, Chiron sofre nas mãos de fortões por ser miúdo e ter trejeitos que indicam uma possível homossexualidade. O roteiro ainda dá uma forçada no estereótipo colocando o menino, antes calado e tímido, se soltando em uma aula de dança. Para, na sequência, voltar a ser o amuado de sempre. O relacionamento com os colegas não é muito fácil, o que o faz ser solitário e se fechar cada vez mais. E assim o acompanhamos ao longo de poucos anos, quase como um novo Boyhood (2014), e conferimos os caminhos seguidos por ele.

Assim como no igualmente muito falado Precious (2009), várias características dramáticas se sobrepõem, tornando o resultado um pouco exagerado. Duas coisas parecem ter trabalhado a favor de Moonlight: a precisão de seu diretor e roteirista, Barry Jenkins (de Medicine for Melancholy, 2008), tecnicamente impecável, e as atuações, todas niveladas por cima. Jenkins, que baseou o roteiro na peça de Tarell Alvin McCraney, faz opções elegantes e cria cenas poéticas, além de conduzir bem seus três Chirons, para que eles mantenham traços similares e ainda demonstrem uma evolução. Ali, muito elogiado e premiado por seu trabalho, não faz muito além de repetir maneirismos vistos em Luke Cage, só muda de figurino. A risada pausada, o jeito calculado de ser ameaçador… Tudo em sua composição lembra projetos anteriores, além de passar pouquíssimo tempo em cena. Mesmo assim, levou o prêmio do Sindicato dos Atores e é favorito ao Oscar como Melhor Ator Coadjuvante.

Tendo agradado a crítica de uma forma devastadora e com altíssimo aproveitamento em sites agremiadores, Moonlight tem uma bela carreira pela frente nos cinemas. Uma pena que, ao invés de aproveitar o barulho do Oscar, com suas oito indicações, a Diamond Films Brasil tenha optado por uma estreia três dias antes da premiação. Quem quiser formar opinião para dar palpites entre os indicados vai ter um prazo curto.

Os três atores que vivem o protagonista, lado a lado

Marcelo Seabra

Jornalista e especialista em História da Cultura e da Arte, é atualmente mestrando em Design na UEMG. Criador e editor de O Pipoqueiro, site com críticas e informações sobre cinema e séries, também tem matérias publicadas esporadicamente em outros sites, revistas e jornais. Foi redator e colunista do site Cinema em Cena por dois anos e colaborador de sites como O Binóculo, Cronópios e Cinema de Buteco, escrevendo sobre cultura em geral. Pode ser ouvido no Programa do Pipoqueiro, no Rock Master e nos arquivos do podcast da equipe do Cinema em Cena.

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