por Marcelo Seabra
Nunca antes, na história da Internet, um filme deu origem a tantos textos em redes sociais. É o que confirma um estudo inventado nesse momento, feito com espectadores de La La Land (2016), que no Brasil ganhou o subtítulo Cantando Estações. A experiência é tão agradável que o público parece impelido a dar sua opinião, e muitas discussões interessantes têm surgido. O longa homenageia o Cinema, principalmente os musicais clássicos, mas trata de temas atuais também, sempre com leveza e com o carisma do casal principal.
Da abertura com a marca do Cinemascope, já sabemos que a nostalgia fará parte do programa. E ela realmente permeia o longa, até na mentalidade de seus personagens. Novamente juntos na tela (depois de Amor a Toda Prova, 2011, e Caça aos Gângsteres, 2013), Ryan Gosling e Emma Stone dão show cantando, dançando e interpretando duas pessoas que acabam se cruzando na Los Angeles atual. Ela é uma aspirante a atriz que, escapando do seu emprego em uma lanchonete, participa de audições para diversos papéis, impulsionada pela lembrança de uma tia querida que tinha essa profissão. Ele é um pianista talentoso que se considera um músico sério, daqueles que querem manter viva a tradição dos figurões do jazz. Nostalgia pura, que está claramente presente até na peça que ela escreve.
Novamente contando uma história no mundo da música (como em seu Whiplash, 2014 – e com J.K. Simmons), o diretor e roteirista Damien Chazelle escancara sua outra paixão: o Cinema. Com diversas referências aos grandes do passado, umas mais discretas que outras, ele lamenta também, além do jazz, o fim dos cinemas de rua, como o Rialto, que levam consigo uma parte da memória da sétima arte. Ao contrário de outra pérola mais recente, O Artista (The Artist, 2011), La La Land se passa nos dias de hoje, mas alguns anacronismos dão um charme extra – como o painel do carro de Sebastian, que mais parece uma jukebox.
As homenagens prestadas não ficam apenas nas referências, no conteúdo. Elas acontecem por dentro e por fora, por assim dizer. Não falta a dança em torno de um poste de Cantando na Chuva (Singin’ in the Rain, 1952), para ficar num exemplo mais óbvio, mas estão lá os cenários típicos da Califórnia, com aquelas casas luxuosas e as colinas em volta, e os números musicais são simples e eficientes. Gosling e Stone não são Fred Astaire e Ginger Rogers, eles sabem de suas limitações, e nem por isso deixam de encantar. A química entre eles funciona bem e as paisagens capturadas por Linus Sandgren (de Joy, 2005) reforçam a magia de Hollywood. E as músicas, escritas e arranjadas por Justin Hurwitz (de Whiplash), vão ficar na sua cabeça por dias, levando inclusive a buscas na Internet.
Apesar do clima descontraído, o filme toca em assuntos mais sérios, mesmo que numa abordagem leve. Não só o fim do jazz e dos cinemas de rua, mas a dificuldade dos relacionamentos nos dias de hoje, principalmente no showbiz; o contraste entre tradição e revolução, reforçado numa fala de John Legend; a barra enfrentada por quem vai às audições e não é respeitado; e a necessidade de se despedir de um sonho para buscar algo mais palpável, que ponha comida na mesa. A metalinguagem no diálogo também é muito bacana. Quando eles falam sobre conversar por cima da música ambiente, o mesmo pode hoje ser observado nas sessões comerciais de Cinema. Gente gritando, como se estivesse no sofá da sala. Em meio a tudo isso, temos aqueles dois tentando se encontrar e alcançar suas aspirações. Nada mais tradicional.
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