Novidade do Netflix parte para o hip hop

por Marcelo Seabra

Depois de se tornar tópico generalizado de conversas com Stranger Things, o Netflix lança agora sua mais nova série, The Get Down. Investindo US$120 milhões no orçamento, o serviço de distribuição entrou em acordo com Baz Luhrmann, cineasta que vinha desenvolvendo o conceito há mais de dez anos. A ideia é acompanhar o surgimento do movimento do rap e hip hop em Nova York enquanto a disco music atingia seu ápice e caminhava para a queda.

Tecnicamente infalível, a série recria uma época com uma caracterização perfeita, de cenários a vestuário. O principal, levando-se em conta o tema, não podia faltar: a trilha sonora. Variando entre o lugar comum e faixas mais obscuras, as músicas são ótimas, assim como a trilha original. Uma das celebridades envolvidas na produção, o rapper Nas é quem assume o vocal nas canções através das quais o protagonista, já adulto, conta a sua história. Os episódios começam com músicas que dão uma ideia de qual será o principal assunto a ser tratado, ou de qual ponto está se partindo. Afinal, não é só de ficção que a série trata, mostrando por exemplo como foi o grande apagão de 77.

Através de flashbacks, conhecemos Ezekiel (Justice Smith, de Cidades de Papel, 2015), um órfão que vive com a tia e o namorado dela na dureza que era o Bronx de 1977. Conhecido pela maioria da população ser negra e pobre, o bairro não recebia muita atenção de autoridades políticas – ou é o que descobrimos pelos personagens. Zeke tem uma inteligência apontada por todos como acima do normal, além de alguns talentos, como tocar piano e escrever bem. Ele é apaixonado pela filha do pastor, Mylene (Herizen Guardiola), que por sua vez tem seus planos bem definidos: se tornar a nova diva da disco. Diversos personagens cruzam o caminho do casal e formam várias subtramas.

As passagens que envolvem ensaios e criações musicais são ótimas e mostram que toda a consultoria técnica valeu a pena. O próprio Grandmaster Flash, vivido na série por Mamoudou Athie, é um dos produtores, e podemos esperar por mais nomes conhecidos nas próximas temporadas. Ou mesmo no final da primeira, já que só a metade dela está disponível. O Netflix optou por lançar apenas a primeira parte, guardando a segunda para 2017. Cinco dos episódios ficam na casa dos 50 minutos, apenas o primeiro bate os 90. Dirigido por Luhrmann (de O Grande Gatsby, 2013), ele tem alguns dos excessos conhecidos do australiano, e chega a ser um pouco cansativo. Este é um dos pontos negativos de The Get Down: há longos trechos que parecem não acrescentar, e podem aborrecer um pouco o público. Outro é o fato de algumas das subtramas parecerem muito frágeis e pouco importante para o todo, o que desvia a atenção do que realmente importa. Mesmo o romance principal não é dos mais engajantes.

Na gíria da época, get down era a parte da música que tinha mais ritmo, um instrumental mais dançante e apelativo, sem vocal ou outros recursos considerados chatos. Com duas pickups (ou vitrolas), os DJs alternavam entre discos e faziam mixagens, privilegiando os get downs e os “poetas”, sementes de rappers que rimavam para levantar a galera. Pois a série também tem essa alternância, com momentos mais emocionantes e excitantes e outros nem tanto. Como não temos os DJs para fazerem as passagens, precisamos aguentar uma parte para nos divertirmos com a outra.

Como podíamos esperar de Luhrmann, a série tem um visual extravagante

Marcelo Seabra

Jornalista e especialista em História da Cultura e da Arte, é mestre em Design na UEMG com uma pesquisa sobre a criação de Gotham City nos filmes do Batman. Criador e editor de O Pipoqueiro, site com críticas e informações sobre cinema e séries, também tem matérias publicadas esporadicamente em outros sites, revistas e jornais. Foi redator e colunista do site Cinema em Cena por dois anos e colaborador de sites como O Binóculo, Cronópios e Cinema de Buteco, escrevendo sobre cultura em geral. Pode ser ouvido no Programa do Pipoqueiro, no Rock Master e nos arquivos do podcast da equipe do Cinema em Cena.

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