Cinebio de Brian Wilson chega à TV

por Marcelo Seabra

Temos os ótimos John Cusack e Paul Dano como o protagonista em épocas diferentes. Temos um gênio da música internacional e sua história com forte apelo dramático. E ainda há a trilha sonora recheada de clássicos de uma banda bastante premiada e admirada. É de se assustar com o fato de Love & Mercy (2014) ter demorado tanto a chegar ao Brasil. E direto na TV a cabo. E o que é pior: com o pavoroso título The Beach Boys: Uma História de Sucesso, que mais engana que explica.

Brian Wilson era o vocalista e fundador do Beach Boys, sim, mas o filme não é sobre a banda. Apesar de ser lembrado como o compositor daquelas canções pueris, grudentas e agradáveis, que falavam de surfe, garotas e carros, Wilson tinha duas questões que o faziam mais interessante do que podíamos supor: uma criatividade aparentemente inesgotável para compor e produzir e uma personalidade abalada por uma doença mental que se manifestou através de ataques de pânico, crises de depressão e vozes que só ele escutava. Tido como brilhante já na época e elogiado por figuras como Paul McCartney, ele lutava contra seus demônios internos para dar conta de seguir criando. O fato de ter feito muita coisa sozinho, enquanto a banda seguia em turnês, também não ajudava. Quando os colegas voltavam, tinham muita dificuldade de entender que caminho era aquele novo, que estava se distanciando muito do que vinham fazendo até então.

A época do lançamento de obras primas como o disco Pet Sounds e do single campeão Good Vibrations foi também o momento quando Wilson teve noção de que sua sanidade estava se esvaindo. Distanciando-se dos familiares, até porque ninguém gostaria de ter um pai como aquele, ele acaba se envolvendo com um psiquiatra que à primeira vista estava devotando a vida à sua cura. No papel do doutor Eugene Landy, Paul Giamatti vai mais longe que o que vimos em Straight Outta Compton (2015). De empresário com jogadas suspeitas naquele filme, ele se tornou aqui um médico abusivo que mantinha seu paciente dopado e dependente, gostando e mantendo a condição de babá de um rockstar milionário.

Enquanto Paul Dano (de Ruby Sparks, 2012) domina o cenário nos anos 60, mostrando Wilson na criação de alguns de seus maiores sucessos e na descoberta de sua doença, Cusack (de Toque de Mestre, 2013) o apresenta na década de 80, após um período claramente complicado de um colapso nervoso. Os atores não se parecem e a diferença de idade nem é tão grande, mas são ambos bem sucedidos em suas missões, em retratos diferentes de uma vida conturbada. Elizabeth Banks (de Magic Mike XXL, 2015) completa o elenco principal, como a mulher que seria fundamental para que Brian saísse de seu marasmo. O elenco de apoio é também muito competente, retratando os outros Wilsons, dentro e fora da banda, os demais membros do grupo e todos que passaram pelo caminho de Brian, como os músicos de estúdio que o ajudaram na realização do icônico Pet Sounds.

As cenas que envolvem artistas em suas atividades, que dependem de talento para simular o ato, costumam ser um ponto fraco desse tipo de filme. Mas, a exemplo de outras cinebiografias recentes de cantores e músicos, ninguém faz feio. A maior parte das aparições junto a um instrumento cabe a Dano, a versão mais jovem, e como ele o resto do elenco também é bem habilidoso. Bill Pohlad, experiente produtor, faz aqui sua segunda incursão na direção e demonstra ter um bom domínio da função. As idas e vindas cronológicas não confundem, mesmo que ele não se preocupe em ficar explicando as coisas, o que demonstra confiança na capacidade dos espectadores. O roteiro de Oren Moverman (de O Mensageiro, 2009) e Michael A. Lerner (de A Guerra de Agosto, 2012) consegue passar pelos momentos mais importantes da vida de Wilson sem parecer episódico, nunca ficando cansativo e sem ter um livro em que se basear.

O verdadeiro Wilson posa com o elenco jovem

Marcelo Seabra

Jornalista e especialista em História da Cultura e da Arte, é atualmente mestrando em Design na UEMG. Criador e editor de O Pipoqueiro, site com críticas e informações sobre cinema e séries, também tem matérias publicadas esporadicamente em outros sites, revistas e jornais. Foi redator e colunista do site Cinema em Cena por dois anos e colaborador de sites como O Binóculo, Cronópios e Cinema de Buteco, escrevendo sobre cultura em geral. Pode ser ouvido no Programa do Pipoqueiro, no Rock Master e nos arquivos do podcast da equipe do Cinema em Cena.

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  • Gosto de ver Elizabeth Banks no Magic Mike XXL (http://www.hbomax.tv/sinopsis.aspx?prog=TTL603305), a história é simples, sem complicações, divertido e excitante. Eu acho que a escolha perfeita quando se é obrigado a passar um momento agradável e esquecer os problemas. Embora pareça concebido apenas para as mulheres, houve alguns aspectos que qualquer homem é identificado. A trilha sonora é excelente.

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