por Marcelo Seabra
Outro ícone cultural a ganhar uma cinebiografia mais recentemente é Jimi Hendrix, um dos guitarristas mais famosos do mundo. Ao invés de querer abraçar o mundo, o diretor e roteirista John Ridley decidiu retratar um período bem restrito na vida do músico, entre 1966 e 1967, quando sua carreira deslanchou. A escolha permite se debruçar com mais calma em seus personagens. Mas Jimi: Tudo a Meu Favor (All Is By My Side, 2013), ao final, conta muito com a bagagem do público para saber o que houve com aquele sujeito. O filme termina quando começa a ficar bom.
Depois de participações interessantes em filmes como Be Cool (2005) e Quatro Irmãos (Four Brothers, 2005), André Benjamin consegue aqui viver um protagonista, e não faz feio. Também conhecido como o compositor e instrumentista André 3000, da dupla Outkast, ele mostra ter sensibilidade para captar um pouco do estilo do biografado, alternando discrição no dia a dia e energia no palco. A cumplicidade entre o ator e a câmera é grande, e ele sabe inclusive quando não olhar, como se não se importasse com ela. Benjamin domina bem o jeito cool de Hendrix, recitando diálogos ora poéticos, ora lisérgicos. Os dois não são exatamente parecidos, mas são próximos o suficiente para comprarmos a ideia, ainda mais com a bela interpretação e o trabalho de figurino e de direção de arte, este fundamental para a recriação da cena musical da Londres da época.
Como a janela temporal mostrada foi bem efervescente culturalmente, não faltam pontas curiosas. Várias celebridades daquele universo desfilam pela tela, das mais relevantes para a história, como Keith Richards e Eric Clapton, às menos importantes, como os Beatles, que são apenas mencionados. Quando se trata de fatos e as pessoas envolvidas ainda estão vivas, pode haver complicações, e foi o que aconteceu aqui. Pessoas próximas a Hendrix, mostradas no filme, foram a público apontar inconsistências e até o que seriam erros grosseiros. Kathy Etchingham, uma das namoradas do músico retratadas, disse terem sido dos melhores anos de sua vida aqueles que viveu com ele. Interpretada por Hayley Atwell (a Agente Carter do Universo Marvel), a garota chega a ser agredida pelo parceiro, e isso nunca teria acontecido.
Atualmente cuidando da série que criou, American Crime, Ridley é mais lembrado como o roteirista de 12 Anos de Escravidão (12 Years a Slave, 2013), trabalho pelo qual ganhou o Oscar, entre outros prêmios. Para essa cinebio, ele não conseguiu os direitos sobre as canções de Hendrix, podendo reproduzir apenas aquelas apresentadas ao vivo, de outros compositores. Para outros momentos da trilha, inclusive quando Benjamin está fingindo tocar, o estilo da Jimi Hendrix Experience foi imitado por músicos contratados, os experientes Waddy Wachtel, Leland Sklar e Kenny Aronoff. A falta é sentida, e a música propriamente dita acaba ficando de lado, priorizando os personagens e as relações entre eles.
Para quem assiste ao filme sem experiência prévia, fica complicado entender a relevância cultural do personagem, mesmo porque ele já estaria fazendo um grande sucesso com singles, antes do lançamento do famoso álbum Are You Experienced. Como o enfoque fica muito no lado pessoal, a parte celebridade fica apagada e o longa peca ao não conseguir diminuir a distância até o público. O resultado é correto, sem conseguir empolgar ou informar devidamente. Continuamos aguardando uma obra sobre Jimi Hendrix, o ídolo da música. Quem sabe começa aqui uma trilogia?
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