por Marcelo Seabra
Com tanta expectativa por ser a adaptação de um bestseller, antes mesmo da estreia Cinquenta Tons de Cinza (Fifty Shades of Grey, 2015) já tinha detratores e defensores, provocando discussões apaixonadas de gente que havia tido contato apenas com o livro de E.L. James. Como com Titanic (1997), mesmo sendo uma bobagem, fica difícil ignorar um lançamento como este. Primeiro lugar no ranking, com um público de quase cinco milhões de espectadores no Brasil em três semanas e um faturamento total estimado em quase 150 milhões de dólares. Sabendo que o orçamento ficou na casa de US$ 40 milhões, não fica dúvida de que as sequências vêm aí.
Muitas discussões surgiram do filme, se ele seria machista, se mostraria a mulher de forma negativa ou algo assim. Qualquer habitante do planeta já deve saber que se trata de uma história de sadomasoquismo, que pretende ser picante, excitante e tudo o mais que a “saga” Crepúsculo não foi no que diz respeito a sexo. James se assume fã da obra dos vampiros e disse em várias ocasiões ter pensado em algo parecido que fosse mais erótico, corrigindo uma falha que ela julgava existir no universo dos Cullen. Mas qualquer polêmica que surja desta nova adaptação vai apenas encobrir a simples verdade: o longa é apenas ruim, como o livro.
Somos apresentados à tímida Anastasia Steele (Dakota Johnson, de Anjos da Lei, 2012), que precisa entrevistar o patrono de sua turma para o jornal da faculdade. Por algum motivo, os colegas escolheram o empresário Christian Grey (Jaime Dornan, da série The Fall). O encontro dos dois já começa com uma promessa de que algo sairá dali. Os dois têm uma atração de cara, e a garota logo descobre que o bilionário, que ficou órfão quando criança, tem gostos singulares – não, ele não é o Batman. Ele tem preferências na cama que uma garota inexperiente como Anastasia pode estranhar. Ele propõe a ela um contrato que estabelece o que pode ou não ser feito entre quatro paredes e a relação entre eles começa a esquentar. O mais ridículo é Grey precisar ter um passado traumático para explicar suas preferências, como um vilão chinfrim de histórias em quadrinhos.
Apesar do bom desempenho como o psicopata em The Fall, Jaime Dornan não esboça qualquer tipo de emoção aqui. Ele impede que Grey tenha expressões, mudanças de entonação ou alguma outra característica humana. E Dakota Johnson tenta fazer o que pode com o material vazio que serve de base para o roteiro, trazendo certa simpatia e espirituosidade à sua personagem. É impressionante como acontecem coisas descabidas, como um falar para a outra se afastar e em seguida procurá-la. Grey usa seu dinheiro para comprar a garota e mostra sua personalidade dominadora em vários aspectos, mas o roteiro parece querer suavizá-lo, para que o público não fique com asco dele. A maior parte das falas é vazia, formada por frases feitas que buscam causar impacto. E não faltam clichês, como Anastasia sair do prédio imponente após um encontro com o sujeito e parar para receber a chuva no rosto, como que numa tentativa de se esfriar.
As cenas de nudez já eram esperadas e não são nem de perto memoráveis, como em filmes como Instinto Selvagem (1992) ou o mais recente Azul É a Cor Mais Quente (2013). Os jogos e instrumentos foram amplamente criticados por praticantes de sadomasoquismo, já que a visão passada desse mundo é a mais tola e superficial possível. Mas, ainda assim, o longa tem levado multidões aos cinemas, mesmo que as mulheres pareçam mais inclinadas que os homens. Sem ter nada inovador, chocante ou mesmo interessante e estrelado por um casal que parece se odiar, Cinqüenta Tons de Cinza terá seu período de consumo e fatalmente cairá no esquecimento, mencionado em conversas de boteco apenas como um modismo sem explicação que felizmente passou.
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