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Keanu Reeves resolve dar o troco

por Marcelo Seabra

Caso alguém ainda tenha dúvida, a resposta é “não”. Keanu Reeves não sabe atuar, nunca soube e dificilmente saberá. O que ele pode sabiamente fazer é escolher roteiros em que seu personagem tenha menos falas e precise demonstrar menos emoções. Esse é o caso de John Wick, ou De Volta ao Jogo (2014), um longa de ação com cara de anos 80 da classe dos que Liam Neeson tem feito – ainda superiores aos de Nicolas Cage. E acaba ficando na média, como uma bobagem divertida que tem uma série de furos enquanto tiros e pontapés são distribuídos.

A exemplo de O Troco (Payback, 1999), em que Mel Gibson atacava meio mundo por causa dos vinte centavos, John Wick sai da sua vida modorrenta de luto quando é atacado em casa e tem tudo que lhe importa tirado dele. Ao que parece, ele era um grande assassino, contratado por gente graúda, até que se aposentou. Cumpriu um último trabalho e teve seu salvo conduto, claro que graças ao amor de uma mulher. Agora que ela morreu e ele não tem mais nada a perder, azar dos invasores. O sujeito vai mover o que for necessário para fazer os culpados pagarem. Ou seja: clichê atrás de clichê. Chega a lembrar também Estrada para a Perdição (Road to Perdition, 2002) pela similaridade de temas, o que empalidece ainda mais a produção.

Com a falta de aptidão de Reeves notada desde a primeira cena, sabemos que devemos prestar atenção em outros aspectos. A fotografia urbana, por exemplo, é interessante e remete a uns vinte e tantos anos atrás. O personagem de Willem Dafoe (de A Culpa É das Estrelas, 2014) é totalmente previsível, assim como a assassina de Adrianne Palicki (de Amanhecer Violento, 2012), como todo o resto. O competente Michael Nyqvist, a exemplo de Missão: Impossível 4 (2011), é mais um vilão mal aproveitado e subdesenvolvido, que só serve para mobilizar o máximo de capangas que puder para aumentar o volume de sangue na tela. E o apagado Alfie Allen (de Game of Thrones) não convence como o filho do chefão, em tese o herdeiro durão do malvado. E o que o John Leguizamo (de Chef, 2014) estava fazendo ali?

Para começo de conversa, John Wick é um assassino extremamente habilidoso, citado mundialmente por suas proezas, mas o jovem russo não o conhece. Mesmo que, possivelmente, Wick tenha trabalhado para seu pai. Os buracos da trama começam aí. É possível então fechar os olhos e visualizar tudo o que vai acontecer. Talvez, na sua imaginação, as cenas de lutas não fiquem tão bem coreografadas, já que os diretores, Chad Stahelski e David Leitch (não creditado), são ex-lutadores e dublês. A pancadaria é o ponto alto do filme, já que tiros são apenas para os mais insignificantes. Personagens importantes devem ser enfrentados no mano a mano.

Passando por um ponto baixo de sua carreira, após o sonolento 47 Ronins (2013) e o pavoroso Man of Tai Chi (2013), Keanu Reeves precisa de uma levantada, e o título nacional desse De Volta ao Jogo seria bem apropriado. O filme chegou aos cinemas do país ocupando a terceira posição nas bilheterias. Já tendo faturado o dobro de seu custo e com algum tempo ainda pela frente, pode ser considerado um sucesso. Reeves tem outros projetos engatilhados, mostrando que nem pensa em se aposentar.

Reeves mostra toda a sua expressividade

Marcelo Seabra

Jornalista e especialista em História da Cultura e da Arte, é mestre em Design na UEMG com uma pesquisa sobre a criação de Gotham City nos filmes do Batman. Criador e editor de O Pipoqueiro, site com críticas e informações sobre cinema e séries, também tem matérias publicadas esporadicamente em outros sites, revistas e jornais. Foi redator e colunista do site Cinema em Cena por dois anos e colaborador de sites como O Binóculo, Cronópios e Cinema de Buteco, escrevendo sobre cultura em geral. Pode ser ouvido no Programa do Pipoqueiro, no Rock Master e nos arquivos do podcast da equipe do Cinema em Cena.

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