por Marcelo Seabra
É claro que não havia como prever que o mundo ficaria sem um de seus grandes artistas. Robin Williams sucumbiu na guerra contra aquele que parece ser o mal do século, a depressão. Já há algum tempo, um dos muitos filmes dessa longa carreira está disponível em locadoras e no serviço Netflix, e ele passou batido pelos cinemas, restando como opção apenas assistir em casa. E é assustadora a conexão entre o longa e a morte do ator. O Melhor Pai do Mundo (The World’s Greatest Dad, 2009) nos apresenta a um pai cujo filho acidentalmente se mata por asfixia, o que é visto por todos como o suicídio de uma alma atormentada.
O detalhe é que o jovem morre durante uma tentativa bizarra de obter prazer sexual se enforcando. Para evitar um escândalo, ou uma grande vergonha, o pai decide acobertar o real motivo da morte, chegando a criar um bilhete de suicídio falso que comove toda a comunidade. Não sabemos se ele faz isso pela memória do filho ou se por ele próprio, para evitar uma situação ainda pior do que a morte do filho. Para um escritor frustrado, é hora de chamar atenção para seus escritos, várias vezes recusados por editoras.
Devido a esta morte estúpida e imprevisível, é natural que muitos busquem elogiar Williams, de fato um grande artista, na comédia e no drama. Em O Melhor Pai do Mundo, ele oferece uma performance irretocável, que permite todos os elogios cabíveis. Dentro das possibilidades do roteiro, escrito pelo também diretor Bobcat Goldthwait, Williams faz sua velha mistura de doçura e amargura para viver um personagem que não sabe mais como agradar os outros, de tanto que se esforça, mas que ainda procura ter alguma recompensa dessa vida injusta. Namorar uma colega professora mais jovem seria uma compensação, mas ela não o leva a sério como deveria.
Como um professor de poesia, assunto que não tem quase nenhuma aceitação entre os estudantes, abandonado pela esposa e tratado com descaso pelo filho (Daryl Sabara, da franquia Pequenos Espiões) e pela suposta namorada (Alexie Gilmore, de Refém da Paixão, 2013), Lance Clayton (Williams) acaba vendo no triste fim do filho uma oportunidade de trabalhar a memória sobre o garoto (há meninas disputando migalhas, algo que nunca ocorreu enquanto ele era vivo) e, ainda, de valorizar seu trabalho. Como escritor e como poeta, é o que ele precisava. O golpe é construído passo a passo e até o diretor da escola é enganado.
Em meio a frases feitas (como a velha “suicídio é uma solução definitiva para um problema temporário”) e provas falsas, fica um pouco chocante o tanto que a arte imita a ficção. O garoto Clayton é tido como herói por muitos, uma figura que paga o preço final por sua genialidade. Algumas falas dos personagens se encaixam perfeitamente na situação agora protagonizada pelo próprio Williams, do lado de cá das telas. Mais um bom trabalho do ator, num filme interessante e tragicamente irônico. Uma falta que será sentida por bastante tempo.
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