Os três de West Memphis chegam aos cinemas

por Marcelo Seabra

Em 5 de maio de 1993, três garotinhos de West Memphis, Arkansas, sumiram. No dia seguinte, os corpos, com muitas marcas de violência, são encontrados e começa a busca por culpados. Um mês depois, a polícia e a comunidade têm certeza dos culpados: três adolescentes tidos como satanistas. As evidências são claras: eles se vestem de preto, se interessam por ocultismo e o pior: escutam heavy metal! Tamanha estupidez foi devidamente documentada na trilogia Paraíso Perdido (Paradise Lost, 1996 – 2011) e em West of Memphis (2012), todos recapitulando os fatos e apresentado depoimentos dos envolvidos.

Tendo os documentários abusado do acontecido, agora é a vez da ficção. Atom Egoyan, diretor de dramas como O Doce Amanhã (The Sweet Hereafter, 1997) e Ararat (2002), encabeça o projeto, que adapta o livro da jornalista Mara Leveritt. Sem Evidências (Devil’s Knot, 2013) tenta levar a um público ainda maior a história dos “três de West Memphis”, e para isso conta com a ajuda dos oscarizados Reese Witherspoon (de Amor Bandido, 2012) e Colin Firth (de Um Golpe Perfeito, 2012). Como era de se esperar, o longa mostra versões estereotipadas de alguns personagens. Mas, por incrível que pareça, a imbecilidade e cegueira de muitos parece ter sido suavizada, já que os fatos indicam que a vida é muito mais chocante que a ficção. Ao menos nesse caso.

Com provas indicando o contrário e absolutamente nada de concreto contra os adolescentes, eles são levados a julgamento e um investigador particular se oferece para ajudar na defesa, junto dos advogados responsáveis. Nos Estados Unidos, o caso ganhou tamanha notoriedade que celebridades falaram a favor dos acusados. Talvez por isso, os críticos norte-americanos não viram graça no longa, que não traz nenhuma novidade para um público que já estava ciente de tudo o que é mostrado. Não há um novo ângulo, ou um detalhe obscuro, nada que já não tivesse sido noticiado. O roteiro, de Paul Harris Boardman e Scott Derrickson (mesma dupla de O Exorcismo de Emily Rose, 2005), não acrescenta, só enumera.

Para quem não conhece os fatos a fundo, Sem Evidências pode ser informativo e interessante. Como boa parte da filmografia de Egoyan, é também frio e distante, mantém o espectador à parte. Ele passa longe da atmosfera envolvente de um, por exemplo, Zodíaco (Zodiac, 2007), ficando apenas como um filme correto, que prima pelos detalhes e pela reconstituição que apresenta. O elenco, que ainda traz Elias Koteas, Dane DeHaan, Alessandro Nivola, Amy Ryan, Stephen Moyer, Bruce Greenwood, Mireille Enos e Kevin Durand, é apropriado, sem nenhum nome a ser destacado. Moyer, que é inglês, repete o sotaque aprendido para a série True Blood, e este é só um exemplo da falta de diferencial do longa.

Assistindo a obras como Mississipi em Chamas (Mississippi Burning, 1988) ou O Massacre de Rosewood (Rosewood, 1997), nos revoltamos contra as injustiças e secretamente torcemos por uma revanche ao final. A diferença entre Sem Evidências e estas outras obras é que, ao contrário dos demais, ele é ambientado na década de 90, e não nos longínquos anos 60, ou antes, e mostra que não temos evoluído tanto quanto gostamos de acreditar. Se ouvir heavy metal é evidência para prender alguém por assassinato, estamos andando para trás.

Imagens de 1993 mostram os suspeitos fichados

Marcelo Seabra

Jornalista e especialista em História da Cultura e da Arte, é atualmente mestrando em Design na UEMG. Criador e editor de O Pipoqueiro, site com críticas e informações sobre cinema e séries, também tem matérias publicadas esporadicamente em outros sites, revistas e jornais. Foi redator e colunista do site Cinema em Cena por dois anos e colaborador de sites como O Binóculo, Cronópios e Cinema de Buteco, escrevendo sobre cultura em geral. Pode ser ouvido no Programa do Pipoqueiro, no Rock Master e nos arquivos do podcast da equipe do Cinema em Cena.

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