por Marcelo Seabra
Acreditando ou não nos aspectos religiosos, a Bíblia é uma reunião de histórias fantásticas, com muito potencial cinematográfico. Um dos personagens mais famosos é Noé, o cara da arca que enfrenta um dilúvio enviado por Deus para limpar a maldade da Terra. Darren Aronofsky, depois dos louros colhidos por Cisne Negro (Black Swan, 2010), decidiu que seu projeto seguinte seria Noé (Noah, 2014), um desafio que poderia atrair a insatisfação tanto de cinéfilos quanto de religiosos. O resultado, do ponto de vista cinematográfico, é acima da média, e Aronofsky evita se aprofundar em discussões filosóficas.
Com uma superprodução na grandeza de O Senhor dos Anéis, o elenco não poderia ser menos espetacular. Para os papéis principais, foi escolhido o casal oscarizado de Uma Mente Brilhante (A Beautiful Mind, 2001), Russell Crowe e Jennifer Connelly. O também premiado Anthony “Hannibal” Hopkins vive o mítico Matusalém, avô de Noé que mais parece um encontro entre o Gollum e o Mestre dos Magos, com uma maquiagem pesada que o deformou bastante. Ray Winstone (de A Invenção de Hugo Cabret, 2011) é o principal antagonista, o rei dos imorais a serem eliminados. Na ala mais jovem, destaque para os colegas de As Vantagens de Ser Invisível (The Perks of Being a Wallflower, 2012), Logan Lerman e Emma Watson.
O filme contextualiza o universo de Noé para que possamos entender como ele chegou a construir uma arca gigantesca, seguindo visões tidas em sonhos nos quais o próprio Criador lhe confia uma missão. Como é o homem o culpado por todas as desgraças que corromperam o planeta, nada mais justo que exterminá-lo e começar de novo, poupando um casal de cada espécie animal que respira sob o céu. Com pequenas liberdades quanto à fonte, o roteiro de Aronofsky e seu produtor Ari Handel traz outros questionamentos, acrescenta uns anjos disfarçados de gigantes de pedra e mostra a progressiva loucura que toma conta de Noé, que insiste em seguir em sua missão aconteça o que acontecer. O filme não abandona totalmente o místico, mas faz um esforço para fincar seus pés no chão, criando uma realidade que precisa ser “comprada” pelo espectador, Tudo, então, passa a ser muito natural e lógico, o que é fundamental para que as ações e as decisões de Noé sejam compreendidas.
Pelo fato de a contextualização ir um pouco longe no tempo, antes até da criação, o filme remete a A Árvore da Vida (The Tree of Life, 2011), talvez sem a megalomania de Terrence Malick. E a forma de contar a história é mais simples e tradicional, sem as invenções das obras anteriores de Aronofsky, como Pi (1998) e Réquiem para um Sonho (Requiem for a Dream, 2000). Quem tem uma boa oportunidade de mostrar serviço é o diretor de fotografia, Matthew Libatique, colaborador habitual do cineasta. Como a escala é bem grande, ele apresenta belos cenários, paisagens e enquadramentos, como o contra-luz de Caim e Abel.
Não é possível ignorar a quantidade de situações na história de Noé que nunca, em hipótese alguma, seriam possíveis – a não ser que você tenha uma fé cega de que tudo é obra de Deus e para Ele tudo é possível. Em um roteiro, essas impossibilidades soam como furos e enfraquecem a obra, no caso de um espectador minimamente cético. E algumas situações que surgem no andar da carruagem tornam a experiência de assistir a Noé mais cansativa, já que prolongam a projeção. Vai ter gente julgando que aquilo não passa de historinha da Carochinha, e outros podem ficar chateados com os vários pontos que não seguem a versão “oficial”, da Bíblia. Como Cinema, no entanto, é tecnicamente impecável, uma obra eficiente a ser apreciada.
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Ponderada e interessante esta critica. Parabens!
Obrigado, e volte sempre!