por Marcelo Seabra
À primeira vista, Jon Martello é um babaca. À segunda, talvez ainda permaneça um babaca. Ele se diz dedicado à família, mas só briga com eles. Parece levar o catolicismo muito a sério, mas paga sua penitência malhando. E não demora a repetir os mesmos pecados: sexo fora do casamento, com mulheres lindas que ele logo dispensa, e masturbação frenética com material pornográfico online. Don Jon, como os amigos o chamam, em referência à habilidade de ficar com as mulheres mais espetaculares, só se importa com o carro, o apartamento e o próprio corpo. Nada mais faz diferença.
É interessante que Joseph Gordon-Levitt, astro de blockbusters como Loopers (2012) e A Origem (Inception, 2010) e de sucessos independentes como (500) Dias com Ela ((500) Days of Summer, 2009), tenha escolhido para si um papel tão moralmente questionável, apostando em seu carisma para buscar alguma identificação do público. Mais desafiador ainda que esta seja a estréia do ator no papel duplo de diretor e roteirista, somando ainda a tarefa de atuar na produção. Mesmo sendo marinheiro de primeira viagem, ele demonstra sensibilidade e honestidade no roteiro, criando personagens críveis e multidimensionais, além de ser um diretor talentoso. Os planos gerais da cidade, os enquadramentos, as passagens, o uso da trilha sonora, é tudo muito adequado. Pode não ser o mais criativo e original, mas está no caminho certo.
O inacreditável título nacional Como Não Perder Essa Mulher esconde o original, o apropriado Don Jon (2013), apelido do personagem que é facilmente identificável com o famoso Don Juan. Mesmo tendo um emprego pouco valorizado e pouco remunerado, Jon é o terror entre as mulheres. Ele e os amigos gostam de dar notas para elas de acordo com os atributos físicos, e ele só vai à caça das que recebem de oito para mais. É nesse grupo que se encontra Barbara, personagem de Scarlett Johansson (a Viúva Negra dos Vingadores, 2012), tão linda que chama a atenção por onde passa. Mas essa garota não será tão fácil de conquistar.
Em meio a tantas comédias românticas sem sal, que inclusive são alvo de críticas no filme, Don Jon é uma opção inteligente e quase fora do gênero, já que o tom não é bem o usual. Esse tipo de produção chega a ser colocado pelo protagonista como o correspondente das mulheres aos filmes pornográficos, que seriam a preferência de todo homem – na opinião dele. Para Jon, pornografia é de fato um vício, e algo que cria em sua cabeça padrões impossíveis de se atingir no mundo real. Ele prefere assistir a um clipe de sexo no computador a praticar com uma parceira, por mais escultural que seja. Nenhuma mulher parece ser tão perfeita, nos sentidos de glamour e satisfação causada, quanto uma atriz pornô. O personagem lembra o Brandon de Michael Fassbender em Shame (2011), mas mais bem humorado e mais otimista. E a produção pega leve na nudez, abusando apenas das cenas que Jon compartilha com o público das obras que ele tanto gosta.
O mais interessante em Don Jon é o rumo que toma o relacionamento dos protagonistas. Não vale entrar em detalhes e estragar a experiência do público, fica apenas essa observação. As coisas podem não ser o que parecem, principalmente para quem está assistindo de fora, caso dos pais de Jon (o sumido Tony Danza e Glenne Headly). E, quando entra em cena uma nova personagem, vivida por Julianne Moore (do novo Carrie – A Estranha, 2013), o longa só tem a ganhar. Como já estamos na reta final do ano, não é imprudente afirmar que se trata de um dos melhores lançamentos de 2013.
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