por Marcelo Seabra
Pode um filme ser açucarado, previsível e, ao mesmo tempo, bom? Frank Capra, há décadas atrás, provou que sim, e Gus Van Sant tenta seguir nesse mesmo caminho com Terra Prometida (Promised Land, 2012). Sorte do diretor poder contar com um ator do naipe de Matt Damon, que segura as pontas com um personagem que já nasce vilão, mas é simpático o suficiente para cativar o público, que se vê torcendo contra os pobres cidadãos de uma cidadezinha da Pensilvânia. Claro que as coisas mudam, valores são reavaliados e tudo pode dar certo no final, como antevemos nos primeiros dez minutos.
Damon, que reafirmou seu talento recentemente em Minha Vida com Liberace (Behind the Candelabra, 2013), vive Steve Butler, um executivo de uma grande empresa exploradora de gás natural que vive de cidade em cidade, mostrando para os habitantes as vantagens de permitirem a extração em seus terrenos. Com toda a convicção, ele afirma que não há riscos, apenas benefícios. Com sua parceira, Sue (Frances McDormand, de Moonrise Kingdom, 2012), ele faz ofertas ridiculamente pequenas e proporciona um grande lucro para a empresa, o que o faz crescer rapidamente. Ninguém melhor do que um jovem criado em uma cidadezinha para se comunicar com pessoas como aquelas.
O problema de Steve começa quando chega na mesma cidade uma “presença ambiental”, como eles chamam os ativistas que tentam dificultar o trabalho deles. Dustin Noble (John Krasinski, de The Office) traz fatos aparentemente incontestáveis, com fotos de gado morto e água contaminada, tudo causado pelo gás. “Não sou uma pessoa ruim”, não se cansa de reafirmar Steve, e nos vemos no meio da disputa desses dois sujeitos carismáticos. E, claro, tinha que aparecer um interesse romântico, vivido por Rosemarie DeWitt (de Vizinhos Imediatos de Terceiro Grau, 2012, acima), bem forçado e conveniente. Completa o quadro o veterano Hal Holbrook (de Lincoln, 2012), como um professor que fará os vizinhos pensarem a respeito antes de aceitarem dinheiro.
Partindo de uma história jornalística de Dave Eggers, Damon e Krasinski se uniram para escrever Terra Prometida, e Damon iria fazer sua estreia na direção. Acabou chamando o amigo Gus Van Sant, com quem trabalhou em Gênio Indomável (Good Will Hunting, 1997), por falta de tempo para desenvolver o projeto, e entregou a direção. Não é um trabalho que possa ser chamado de autoral, ou pessoal, já que muitos teriam feito o mesmo. Van Sant assume um ritmo lento e deleita-se pelas paisagens bucólicas do campo americano. O próprio roteiro, como se pode perceber pelas linhas anteriores, não é uma beleza, seguindo sempre por um caminho seguro.
O assunto tratado em Terra Prometida é relevante e tem sido discutido. O processo chamado fraturação hidráulica (ou “fracking”, em inglês) traz resultados, mas tem consequências imprevisíveis. Trata-se de perfurar um solo onde há reservas de gás presas em rochas, e produtos químicos são injetados para permitir a extração desse gás. É considerado por muitos como um projeto gerível, ou seja, um risco calculado. Os danos causados não são certos e são considerados pequenos, quando existem, perto do retorno. Corporações ligadas ao negócio reclamaram que o filme reforçaria uma visão negativa sobre a atividade, e é bem capaz que essa fosse uma das intenções dos realizadores. Afinal, capitalistas selvagens dificilmente são mostrados de forma atenuada no Cinema, e mesmo o Steve de Damon tem o seu lado obviamente ambicioso. Ás vezes, rende mais olhar para o outro lado do que ter princípios.
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