por Marcelo Seabra
Ao pensar num ambiente com falta de gravidade, sempre me vem à cabeça um episódio de Os Simpsons no qual Homer come batatinhas voando pela nave, rolando poeticamente no ar. Potencial cômico existe, e muito, mas as coisas podem pender para o terror facilmente, como já provaram Sigourney Weaver e companhia nos vários Aliens. O pior, no entanto, é o pânico que pode tomar uma pessoa vagando no espaço não por causa de criaturas esquisitas e ameaçadoras, mas por algo bem mais simples: a falta de controle do próprio corpo, que se mexe involuntariamente, e a falta de ar. É desse terror que trata Gravidade (Gravity, 2013), um longa maravilhosamente realizado que é facilmente um dos melhores do ano.
O cineasta mexicano Alfonso Cuarón já provou seu talento em vários gêneros, passando até pela série de Harry Potter (O Prisioneiro de Azkaban, 2004). Depois de um hiato de sete anos, quando fez o emocionante Filhos da Esperança (Children of Men, 2006), ele partiu para uma história simples, escrita com seu filho Jonás Cuarón, e levou seu elenco para o espaço. Pode parecer uma ficção científica para um desavisado, mas trata-se de um drama, um estudo de personagem. Os Cuaróns colocam a protagonista em uma situação extrema e ela deve resistir e, como diz o cartaz, não se entregar.
Sandra Bullock, na melhor interpretação de sua carreira, vive a Dra. Ryan Stone, uma astronauta de primeira viagem que precisa instalar um novo software no telescópio Hubble. A equipe da nave Explorer é liderada pelo experiente Matt Kowalski, vivido pelo esperto George Clooney (acima), que não se importa em ser coadjuvante desde que o filme seja bom. Stone e Kowalski saem da nave para cumprir sua missão, mas são surpreendidos por uma chuva de destroços. A partir daí, segue-se uma luta pela sobrevivência. Não é interessante descrever mais o enredo, até para evitar spoilers, e também porque a história não é o principal aqui.
Gravidade é o filme que melhor utiliza o recurso da terceira dimensão, dando diferentes perspectivas aos vários elementos que vemos na tela. Cuarón convocou seu colaborador tradicional, Emmanuel Lubezki, para cuidar da fotografia, e o resultado é digno de todos os prêmios possíveis. A câmera roda como se realmente não houvesse gravidade, e entramos no capacete da personagem sem pedir licença, trocando de ponto de vista. Não poderiam faltar imagens da Terra vista de cima, e Kowalski faz questão de marcar o quão belo é aquele momento. Além da beleza visual, o som é outro ponto a ser ressaltado. “No espaço, ninguém pode te ouvir gritar”, já avisava o cartaz de Alien (1979). E temos um uso fantástico do som, alternando períodos silenciosos com as falas dos personagens e, o que causa mais tensão, a respiração nervosa deles.
O trailer, quando divulgado, ajudou a aumentar a expectativa e muita gente não conseguia esperar para conferir o longa. Se uma amostra de dois minutos já conseguiu tamanho efeito sobre o público, imagine 90 minutos bem desenvolvidos? Gravidade é uma obra aparentemente simples, mas não se engane: Cuarón usa todos os recursos à mão para fazer ótimo Cinema. Sempre buscando veracidade, ele não precisa apelar a nenhuma fantasia, deixando o ser humano à sua própria sorte naquela vastidão aterrorizante.
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