por Marcelo Seabra

A partir desta sexta, os brasileiros poderão conferir o novo trabalho do diretor Michael Haneke, Amor (Amour, 2012). O longa vem acumulando diversos prêmios, como a Palma de Ouro em Cannes e o Globo de Ouro de Melhor Filme Estrangeiro, e concorre em outras tantas cerimônias a serem realizadas, como o Oscar (com cinco indicações). Boa parte da atenção recebida deve-se ao nome do diretor, ele próprio detentor de vários prêmios e já cercado por uma aura cult que torna seus filmes obrigatórios. Mas o casal de protagonistas realmente merece uma conferida: são os ótimos veteranos franceses Jean-Louis Trintignant e Emmanuelle Riva.

O público, na condição de voyeur, acompanha a pacata vida de um casal que já passou dos oitenta e ainda demonstra grande carinho um pelo outro. Após sofrer um derrame, a senhora passa a demandar muitos cuidados, o marido passa a viver em função dela e a relação deles passa a ser testada diariamente. Assim como em A Professora de Piano (Le Pianiste, 2001), Haneke usa personagens ligados à música em um drama aparentemente simples, que logo começa a revelar suas outras camadas. Trintignant (de filmes como Z, de 1969, e A Fraternidade É Vermelha, 1994) e Emmanuelle (de A Liberdade É Azul, 1993) têm uma interação possível apenas a velhos amigos, e são acompanhados pela não menos competente Isabelle Huppert, a professora de piano do longa homônimo, que vive a filha do casal.

Enquanto, para observadores externos, pode parecer que o marido é quase um herói e todos o elogiam, já que ele demonstra todo o seu amor pela esposa em suas ações. Para ele, o suplício não é ter que cuidar dela, mas ter que vê-la naquela condição e saber que dentro daquele corpo deficiente há uma mente sadia aprisionada. E seria só o começo da decadência física. E, para a filha, é difícil, mas de outra maneira: ela não tem ideia do que fazer. Como se portar? Como ajudar? Por mais que se queira e se importe, como lidar com essa situação?

Com longas tomadas, Haneke nos lembra que a vida não é composta apenas pelas ações principais, esticando momentos além do que o Cinema tipicamente americano mostra para que possamos realmente conhecer os personagens. Nas pequenas ações, entendemos o porquê do título, bem genérico, mas apropriado aos idosos que mantêm o afeto e a cumplicidade mesmo tendo vivido tantos anos juntos. O apartamento onde eles vivem é espaçoso e confortável, e o diretor aproveita essas características para ressaltar a solidão em que se vê o marido quando a esposa fica debilitada. Quase como um reality show, acompanhamos a intimidade deles. É uma visão assustadora, mas realista, apesar de pessimista, do futuro que aguarda a todos nós.

O diretor orienta seu elenco

Marcelo Seabra

Jornalista e especialista em História da Cultura e da Arte, é mestre em Design na UEMG com uma pesquisa sobre a criação de Gotham City nos filmes do Batman. Criador e editor de O Pipoqueiro, site com críticas e informações sobre cinema e séries, também tem matérias publicadas esporadicamente em outros sites, revistas e jornais. Foi redator e colunista do site Cinema em Cena por dois anos e colaborador de sites como O Binóculo, Cronópios e Cinema de Buteco, escrevendo sobre cultura em geral. Pode ser ouvido no Programa do Pipoqueiro, no Rock Master e nos arquivos do podcast da equipe do Cinema em Cena.

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