Comédia nacional consegue subir um pouco o nível

por Marcelo Seabra

Do jeito que andam as comédias brasileiras, a última coisa que eu iria querer é assistir a mais uma, depois de passar raiva com Cilada.com (2011), Agamenon (2011) e E Aí, Comeu? (2012). Mas eis que surge Até que a Sorte Nos Separe (2012) e, por ser brasileiro e não desistir nunca, vou conferir. Ao mesmo tempo em que confirmo não se tratar de nada minimamente memorável, constato que não é tão ruim quanto esperava e até dá para achar graça aqui e ali. Assim como os já citados, a bilheteria deve ser boa, já que tem sempre público para este tipo de filme.

Por algum motivo, alguém achou uma ótima ideia ficar lembrando que trata-se do mesmo diretor e mesmo roteirista do De Pernas pro Ar (2010), Roberto Santucci e Paulo Cursino (além de Angélica Lopes). E dá um pouco de credibilidade citar o livro que inspirou o roteiro, o best seller Casais Inteligentes Enriquecem Juntos, de Gustavo Cerbasi. O autor dá conselhos financeiros sérios e isso é exatamente o que falta ao casal de protagonistas, vividos por Leandro Hassum e Danielle Winits. Eles ganham milhões na loteria, mas gastam tanto que se vêem quebrados pouco mais de uma década depois.

Hassum, daquele programa mala de TV Os Caras de Pau, é uma grata surpresa. Carismático, é ele quem segura o longa e responde pelos momentos mais divertidos. Apesar de alguns exageros, ele mostra um bom timing cômico e aproveita bem a desgraça que seu personagem experimenta. Tino era um personal trainer que morava em um apartamento simples com a filha recém-nascida e a esposa quando ela ganha na loteria e eles vêem tudo mudar. Alguns anos depois, aquele casal sereno do início parece não existir mais, eles agora são perdulários e histriônicos. Fazem questão de dar festas homéricas, viajar para fora várias vezes por ano e ficar bem longe de algo parecido com trabalho. Os filhos, bem jovens, vão para o mesmo caminho, estragados por tanta esbanjação.

Um belo dia, Tino descobre que a conta para tanta falta de noção chegou e ele está no vermelho. Ao mesmo tempo, por indicação do médico, ele decide esconder o fato da esposa e começa o malabarismo para acobertar a verdade. Um vizinho do casal, o consultor financeiro interpretado por Kiko Mascarenhas, entra na história para ajudar Tino, mesmo a contragosto. Winits, longe de ser atriz, não compromete, ficando no básico necessário para Hassum poder entreter o público. Mais lembrada pelo corpo siliconado e malhado, ela fica bem como a perua deslumbrada que se acostumou com o alto padrão de vida. Seu visual passou por uma revolução, com o rosto esticado, cabelo mais louro que o usual e lentes de contato. Mascarenhas faz o contraponto sisudo a Hassum, e é claro que ambos vão ensinar alguma coisa ao outro.

Tecnicamente, Até que a Sorte Nos Separe tem alguns mistérios – e isso não é bom. O áudio parece fora de sincronia e temos a impressão de que os atores estão sendo dublados. A continuidade às vezes não existe, e notamos diferenças entre cortes numa mesma sequência. Isso tudo parecia superado pelo cinema nacional, mas volta e meia vem assombrar. Nada que atrapalhe o programa de quem costuma gostar das comédias brasileiras atuais. Se não é o seu caso, procure melhor.

Essa criatura loura é Danielle Winits

Marcelo Seabra

Jornalista e especialista em História da Cultura e da Arte, é atualmente mestrando em Design na UEMG. Criador e editor de O Pipoqueiro, site com críticas e informações sobre cinema e séries, também tem matérias publicadas esporadicamente em outros sites, revistas e jornais. Foi redator e colunista do site Cinema em Cena por dois anos e colaborador de sites como O Binóculo, Cronópios e Cinema de Buteco, escrevendo sobre cultura em geral. Pode ser ouvido no Programa do Pipoqueiro, no Rock Master e nos arquivos do podcast da equipe do Cinema em Cena.

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