Charlize Theron é uma ótima e detestável jovem adulta

por Marcelo Seabra

Assim como o Coringa de Heath Ledger, a Mavis Gary de Charlize Theron é uma força da natureza. Não há muito o que explicar, ou não é preciso. Ela era a rainha do baile, a menina linda e popular que pisava em quem era “normal”, algo inadmissível para ela. Normalmente, esse tipo de personagem é a vilã de filmes com adolescentes, como em Meninas Malvadas (Mean Girls, 2004). No caso de Jovens Adultos (Young Adult, 2011), ela é a protagonista, e você não tem necessariamente que gostar dela.

Perto dos 40, ela continua linda, mas tem bastante maquiagem envolvida no processo, e podemos conferir o antes e depois. Um casamento – e divórcio – é mencionado, mas não se entra em detalhes. Mavis é uma escritora-fantasma de uma série juvenil (ou para jovens adultos, como ela reforça) que já teve mais sucesso, e é preciso procurar bem para encontrar seu nome em uma edição, já que só a criadora da obra aparece na capa. Seu apartamento é pequeno e bagunçado, ela bebe um refrigerante nada saudável como água e entorna todo tipo de bebida alcoólica, beirando o vício.

Para os habitantes da pequena Mercury, em Minnesota, Mavis é das filhas mais bem sucedidas, uma que foi para a capital e “venceu” na vida. Na verdade, ela anda tão sem rumo que praticamente pira ao receber um e-mail de um ex-namorado dos tempos de colégio anunciando o nascimento do primeiro filho. Buddy (Patrick Wilson, de Watchmen, 2009) é o típico sujeito legal, se adaptando à nova condição de pai, e Mavis se convence que eles deveriam ter sido felizes para sempre. E acha que não é tarde demais para correr atrás.

Charlize Theron, que já tinha modificado bastante sua aparência em Monster (2003), que acabou lhe valendo o Oscar, agora exibe uma personalidade feia, por assim dizer. Totalmente sem noção, ela se convence de verdades que só ela vê e pretende atropelar tudo e todos no processo de conseguir o que quer. A única pessoa que acaba entrando em seu caminho é o pária Matt Freehauf (o ótimo Patton Oswalt, de diversas séries, como King of Queens – ao lado). Deficiente depois de um espancamento equivocado, Matt é a verdade, é a realidade que bate à porta de Mavis, é quem diz o que ela não quer ouvir. E a dinâmica entre eles é ótima.

Os três atores que compõem o centro do longa acertam primorosamente na composição de seus personagens. Todos poderiam ter errado feio, começando pela principal: seria fácil para Charlize fazer uma mulher irreal, exagerada, uma caricatura detestável. Wilson faz o cara bacana, que era o atleta do colégio, que todos admiravam, e consegue evitar o estereótipo do certinho, mostrando um homem bom, mas passível de erros. E Oswalt, se fosse menos competente, teria sido o gordinho chato de plantão, o que evita ao dar mais profundidade a Matt, é de fato alguém com sentimentos, que mescla bondade com ressentimento.

Jovens Adultos marca a nova colaboração entre o diretor Jason Reitman e a roteirista Diablo Cody, incensados em 2007 por Juno, aquele filme engraçadinho sobre a menina verborrágica que fica grávida e é obrigada a amadurecer rápido. Ao contrário de Juno, Mavis não amadurece, parece manter a mesma cabecinha que tinha quando adolescente. Dizer que ela é uma jovem adulta é um belo eufemismo para justificar sua imaturidade, um título muito adequado, com bastante sarcasmo. Afinal, o tipo de humor da obra é bem sombrio: parece que os autores querem rir das figuras características de sua terra, como a “prom queen”, a rainha do baile de formatura. Os americanos não parecem ter gostado da piada, já que a bilheteria não foi bem sucedida, mas os brasileiros poderão se deliciar. Pena que, ao menos em BH, apenas em uma sala.

"Ele vai ser meu... Ah, vai!"

Marcelo Seabra

Jornalista e especialista em História da Cultura e da Arte, é mestre em Design na UEMG com uma pesquisa sobre a criação de Gotham City nos filmes do Batman. Criador e editor de O Pipoqueiro, site com críticas e informações sobre cinema e séries, também tem matérias publicadas esporadicamente em outros sites, revistas e jornais. Foi redator e colunista do site Cinema em Cena por dois anos e colaborador de sites como O Binóculo, Cronópios e Cinema de Buteco, escrevendo sobre cultura em geral. Pode ser ouvido no Programa do Pipoqueiro, no Rock Master e nos arquivos do podcast da equipe do Cinema em Cena.

View Comments

  • Esse filme chega despretensioso e mesmo desprestigiado, mas é muito melhor que alguns dos considerados "melhores do ano" de 2011.

  • É um filme ótimo. Adorei o personagem de Mavis, uma mulher pretensiosa , pois acha possível resgatar um amor de juventude, que não consegue enxergar que acabou.Imagino quantas Mavis existem por si. Filme excelente!

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