Você não conhece Anvil, mas deveria!

por Rodrigo “Piolho” Monteiro

Dois filmes muito similares em suas propostas foram lançados em 2008, ainda que suas abordagens sejam completamente diferentes entre si. Um deles, O Lutador, trouxe Mickey Rourke de volta às luzes da ribalta ao retratar a história do profissional de luta livre que, um dia ídolo de multidões, tenta recuperar sua antiga glória vinte anos após seu melhor momento ter passado. O outro, Anvil: The Story of Anvil é um documentário sobre 2 roqueiros canadenses que tentam, a todo custo, recuperar a glória da qual desfrutaram por um breve período nos anos de 1980. Um pouco de contexto é necessário para situar o leitor.

A história do Anvil começa em 1973, quando os colegas de escola Steve “Lips” Kudlow (vocal e guitarra) e Robb Reiner (baterista) se juntam a um guitarrista local para montar uma banda. Cinco anos depois, com a adição de Dave “Squirrely” Allison (vocais e guitarra) e Ian “Dix” Dickson (baixo), a banda Lips começaria a seguir a mesma trajetória de qualquer banda iniciante atrás de gravadoras. Três anos depois, já renomeada Anvil, Lips, Kudlow & cia debutariam com Hard ‘N’ Heavy.

Em termos musicais, o início dos anos 1980 foi marcado por um grande movimento chamado NWOBHM (New Wave of British Heavy Metal – “A Nova Onda do Heavy Metal Britânico”) cujo maior representante ainda ativo é o Iron Maiden. A influência do movimento não se restringiu à terra da Rainha e diversas bandas do outro lado do Atlântico se beneficiaram dele. O Anvil foi um deles. A banda obteve um certo sucesso naqueles anos, sendo seu ápice um festival no Japão ao lado de gigantes da época, como o Scorpions e Bon Jovi, em 1984. Citado como influência por grandes nomes do metal como Kerry King (Slayer), Slash (ex-Guns ‘N’ Roses) e Scott Ian (Anthrax), tudo levava a crer que o Anvil marcaria a história da dita música pesada. E realmente, isso aconteceu. Mas não da forma que todos poderiam esperar.

Do Japão de 1984, pulemos para Toronto, Canadá, em 2006. É lá que o diretor Sasha Gervais (mais conhecido por ter escrito o roteiro de O Terminal, de Steven Spielberg) encontra Steve Kudlow e Robb Reiner. Duas estrelas consagradas de rock com 30 anos de estrada, fama e sucesso? Não mesmo. Mais de vinte anos após seu grande momento, as duas mentes por trás do Anvil levam vidas quase patéticas, ainda que bastante honestas: Lips sustenta sua família trabalhando como entregador de merendas escolares, enquanto Reiner trabalha na construção civil. E, sim, os dois continuam perseguindo aquela chance que tem certeza merecer.

Lançado no fim de 2011 por aqui para o mercado de homevideo, Anvil: The Story Of Anvil é um dos mais interessantes e honestos documentários sobre música já feitos. Sasha Gervais, um grande fã do Anvil, decidiu ficar ao lado da banda por praticamente dois anos, registrando seus (raríssimos) altos e seus (constantes) baixos. Da arena no Japão, o Anvil reduziu-se a uma banda que toca em casas minúsculas no Canadá, para uma base fiel de fãs. Quando conseguem a chance de uma excursão de um mês pela Europa, o cenário muda, mas a rotina não. Liderados por uma empresária tão bem intencionada quanto incompetente, o Anvil toca em bares para platéias de, muitas vezes, meia dúzia de pessoas. Literalmente. E praticamente não recebem nada pelos serviços prestados, chegando ao cúmulo de serem pagos com comida.

Tudo isso parece roteiro de uma comédia, mas não é bem isso. Anvil: The Story of Anvil é uma história tocante sobre dois homens que, mesmo na casa dos 50 e com todos os prognósticos negativos, perseguem seu sonho de infância. Filmado e editado de maneira brutalmente honesta por Gervais, o documentário foi muito bem recebido por crítica e público em geral, incluindo, obviamente, pessoas que nunca haviam ouvido falar da banda. O filme teve sua estréia no Festival de Sundance em 2008, e naquele ano foi premiado com o Audience Awards no Sydney Film Festival, no Los Angeles Film Festival e no Galway International Film Festival. Em 2009, foi premiado como Melhor Documentário no Evening Standard British Film Awards e, no ano seguinte, levou o mesmo prêmio do 2010 Independent Spirit Awards de Los Angeles.

Mais importante que qualquer prêmio é que, ao abrir as portas de seu cotidiano e mostrar sua rotina diária sem pudores, Lips e Reiner atraíram também a atenção das pessoas certas. Desde 2008, o Anvil encontrou uma sobrevida e conseguiu o sucesso perseguido durante três décadas: hoje, finalmente, os dois cinquentões podem viver exclusivamente de sua música., tendo, inclusive, passado por terras tupiniquins em 2011 e já com a segunda vinda confirmada como uma das atrações do Metal Open Air, festival que acontece em abril no Maranhão.

Robb e Lips seguem firmes na luta pela carreira

Marcelo Seabra

Jornalista e especialista em História da Cultura e da Arte, é mestre em Design na UEMG com uma pesquisa sobre a criação de Gotham City nos filmes do Batman. Criador e editor de O Pipoqueiro, site com críticas e informações sobre cinema e séries, também tem matérias publicadas esporadicamente em outros sites, revistas e jornais. Foi redator e colunista do site Cinema em Cena por dois anos e colaborador de sites como O Binóculo, Cronópios e Cinema de Buteco, escrevendo sobre cultura em geral. Pode ser ouvido no Programa do Pipoqueiro, no Rock Master e nos arquivos do podcast da equipe do Cinema em Cena.

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  • É, o mundo da musica é estranho, principalmente quando falamos de um estilo musical tão reservado e sem interesse da midia (a não ser que você se drogue muito e ou saia quebrando tudo). Bem nessa transição toda da globalização, internet, etc.. muitos ficaram para trás, midias fisicas (CD, cassete ou Lp), devem acrescentar muito pouco hoje em dia nas vendas de qualquer artista, que por sua vez, tem que se submeter a turnês exaustivas para poder não só sobreviver de musica, mas como manter seu nome "ativo" no cenário (sem contar que se gasta um tempo bom para gravar um novo disco, ou seja tempo sem shows e sem grana).
    E o que tiramos de tudo isso? Não desista de seus sonhos, Esteja sempre com as pessoas certas, tenha fé no que faz, mas sempre tenha um bote para caso o barco afunde (plano B). Belo texto e concordo com você, "Se não conhece Anvil, deveria conhecer!"

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