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Filmagens perdidas, o demônio e nada mais

por Marcelo Seabra

Em uma temporada de premiações, com o Oscar chegando, dificilmente um filme de terror de baixo orçamento ganharia alguma atenção. Foi feito um certo barulho, sobre supostas cenas muito reais de exorcismo, e fica sempre aquela suspeita de tratar-se de um longa baseado em fatos. No fim, muito se prometeu e pouco se cumpriu. Como uma menina de uns 15 anos disse no final da projeção, parece que os realizadores de Filha do Mal (The Devil Inside, 2012) se cansaram e decidiram encerrar a história de qualquer jeito. Diga-se de passagem, pena que isso não foi a única coisa que ela falou.

Apesar do que pode parecer, passa-se a sessão inteira sem grandes emoções. Gritos e efeitos de pernas e braços que viram para os lados errados são constantes. O que o filme traz à tona não é bem o que William Brent Bell, seu diretor e roteirista, pretendia. Cansaço, impaciência e incredulidade são o que vêm à mente. E a moda das “filmagens encontradas” custa a passar, mesmo que não se acrescente nada à fórmula que fez a fama de A Bruxa de Blair (The Blair Witch Project, 1999).

A tal filha do mal é Isabella Rossi (vivida pela insossa paulista Fernanda Andrade), uma pessoa da qual não sabemos nada além de que a mãe está internada em um hospício em Roma e que o pai faleceu algum tempo antes. Sem procurar a mãe por anos, sem notícia alguma, ela resolve fazer um documentário (?) sobre a dita cuja, indo para a Itália com um documentarista a tira colo. Claro que, se você tem 25 anos e passou a maior parte deles sem a mãe e acaba descobrindo pelo pai moribundo que ela matou três pessoas quando passava por um exorcismo, você vai querer filmar tudo. E, depois, ficar xingando o cara que você mesmo contratou e paga, já que o indivíduo fica perguntando “O que você está sentindo?” e mirando a câmera na sua cara.

Ao participar de uma (é, uma) aula de um padre exorcista no mesmo curso de O Ritual (The Rite, 2011), Isabella conhece outros curiosos, já que a turma é aberta a qualquer um (que podem entrar a qualquer momento – e até filmar). Além de um cético mala que nega tudo, sempre, ela se aproxima de dois padres que têm bastante bagagem no assunto. Fica a questão: se eles já realizaram vários exorcismos e já sabem tanto sobre aquilo, para que participar daquela aulinha? Eles mesmos a desmerecem, dizendo que um exorcismo real ensina muito mais que três meses daquele curso. Como saber a diferença entre doença mental e possessão demoníaca? “Você sabe de olhar”, é o que eles dizem. Para que estudar, então?

Engraçado, quanto mais se pensa sobre Filha do Mal, pior fica. Será que esse William Brent Bell e seu amigo Matthew Peterman (ambos do igualmente brilhante Stay Alive – Jogo Mortal, 2006) não releram o roteiro antes de entrarem em produção? E o que teria acontecido com aquele final? Preguiça pura? Tédio? Ou toda a criatividade que tinham foi gasta na primeira hora e vinte de filme? Comédia e terror têm isso em comum: muito se faz, mas fazer bem é tão difícil! Vou aproveitar e rever O Exorcista, matar a saudade de um ótimo exemplar do gênero.

Marcelo Seabra

Jornalista e especialista em História da Cultura e da Arte, é atualmente mestrando em Design na UEMG. Criador e editor de O Pipoqueiro, site com críticas e informações sobre cinema e séries, também tem matérias publicadas esporadicamente em outros sites, revistas e jornais. Foi redator e colunista do site Cinema em Cena por dois anos e colaborador de sites como O Binóculo, Cronópios e Cinema de Buteco, escrevendo sobre cultura em geral. Pode ser ouvido no Programa do Pipoqueiro, no Rock Master e nos arquivos do podcast da equipe do Cinema em Cena.

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