Blockbuster sobre viagem no tempo vai mais longe

por Marcelo Seabra

Alguns diretores pisam na bola quando têm muito dinheiro para fazer um filme, Joel Schumacher é um grande exemplo. Duncan Jones conseguiu mostrar que não é o seu caso, pulando dos cinco milhões de Lunar (Moon, 2009) para os 32 de Contra o Tempo (Source Code, 2011) e mantendo a qualidade. Pode-se dizer que é mais um caso de cinema de autor, e não deixa de ser ao mesmo tempo um blockbuster hollywoodiano.

Temos que comemorar que Contra o Tempo, mesmo que com um certo atraso, tenha chegado aos cinemas brasileiros, o que não aconteceu com Lunar. Desta vez, temos um ator que mobiliza mais o público, Jake Gyllenhaal (de Amor e Outras Drogas, 2010), e muito mais ação. O conceito pode parecer complicado de entender, mas flui muito bem na tela. Para quem gostou de Deja Vu (de 2006), será um prato cheio, e o filme não deixa de ter algo de Feitiço do Tempo (Groundhog Day, 1993), já que o mesmo período de tempo se repete quantas vezes for necessário e só uma pessoa tem consciência disso. Só que, desta vez, é proposital.

Gyllenhaal vive o Capitão Colter Stevens, um militar condecorado que é destacado a um novo projeto: o código-fonte. Através das descobertas e estudos de um cientista (vivido por Jeffrey Wright, o Felix Leiter dos novos 007), é possível aproveitar os últimos oito minutos de vida de uma pessoa que já morreu enviando alguém a um passado recente para assumir o corpo dela. Assim, em casos de ataques terroristas, pode-se tentar descobrir o criminoso. Stevens, então, é enviado a um trem que explodiu, no corpo de um professor de história, para tentar identificar o terrorista e impedir uma próxima ação, já anunciada – loucos homicidas sempre falam demais.

Assim como acontece no já citado Deja Vu, o protagonista consegue reviver a cena, mas não pode alterá-la. E, novamente, interessa-se por uma garota (Michelle Monaghan, de Um Parto de Viagem, 2010) que tem a morte certa no mesmo evento. Não deve ser nada interessante estar dentro de um trem que irá explodir em oito minutos, sabendo que todos ali terão um destino trágico, e se ver impotente frente a tudo isso. A cada nova volta, Stevens deve conseguir mais informações para conseguir montar o quebra-cabeças. E questões sobre o tempo e a sua relatividade vão surgindo, o que é sempre um ótimo bônus em filmes que, à primeira vista, seriam apenas mais um passatempo descerebrado e esquecível.

Jones, com Lunar, criou uma obra que trazia muita coisa escondida atrás de uma fachada de simplicidade – leia mais aqui. E ele consegue mais uma vez atingir este patamar e imprimir uma marca própria no longa, deixando definitivamente de ser apenas “o filho de David Bowie”. E o roteirista Ben Ripley (de A Experiência 3 e 4), em sua estreia em um longa para cinema, também merece elogios, já que tudo partiu de uma ideia original dele.

O gênero ficção-científica parte de algo supostamente real para rapidamente enfiar os dois pés na fantasia e apela diretamente à suspensão de descrença, tal qual acontece em uma adaptação de quadrinhos. Se podemos acreditar nos feitos do Dr. Frankenstein ou nos procedimentos de invasão dos sonhos de A Origem (Inception, 2010), por que não aceitaríamos o código-fonte?

Marcelo Seabra

Jornalista e especialista em História da Cultura e da Arte, é mestre em Design na UEMG com uma pesquisa sobre a criação de Gotham City nos filmes do Batman. Criador e editor de O Pipoqueiro, site com críticas e informações sobre cinema e séries, também tem matérias publicadas esporadicamente em outros sites, revistas e jornais. Foi redator e colunista do site Cinema em Cena por dois anos e colaborador de sites como O Binóculo, Cronópios e Cinema de Buteco, escrevendo sobre cultura em geral. Pode ser ouvido no Programa do Pipoqueiro, no Rock Master e nos arquivos do podcast da equipe do Cinema em Cena.

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