Rio promete arrebatar multidões com seus ritmos e cores

por Marcelo Seabra

Depois de conduzir sozinho as duas continuações de A Era do Gelo (Ice Age 2 e 3, de 2006 e 2009), o diretor carioca Carlos Saldanha se viu pensando em qual seria seu próximo projeto. E concluiu: nada melhor que contar com terreno seguro e ficar em um ambiente que conhece bem – apesar de morar fora do país há bastante tempo. Assim surgiu a animação Rio (2011), uma obra de arte dedicada à cidade que, após uma sessão do longa, pode e deve ser chamada de maravilhosa. Segundo Saldanha, é a realização de um sonho de mais de dez anos.

Na trama, acompanhamos a arara azul Blu (na dublagem original, com voz de Jesse Eisenberg, de A Rede Social, 2010) em sua viagem ao Brasil, saindo de uma pequena e apagada cidade norte-americana. Sua dona, Linda (Leslie Mann, de Funny People, de 2009), é procurada por um ornitólogo, Túlio (voz do galã Rodrigo Santoro), para que eles salvem a espécie da extinção promovendo um encontro entre Blu e a sua Jade (Anne Hathaway, apresentadora do último Oscar e atual namorada de Hollywood). Enquanto todos eles estão se conhecendo, aparecem criminosos dispostos a ganhar dinheiro com as aves e a confusão começa.

A história não foge do previsível, mas ela não é o mais importante aqui. Rio tem ótimos coadjuvantes, como o buldogue Luiz (Tracy Morgan, da série 30 Rock), que proporcionam momentos bem engraçados. Os macaquinhos lembram o rei Julien e seus súditos de Madagascar (2005 e 2008) e também divertem, e o filme explora bem a riqueza da fauna brasileira, com tucanos, periquitos etc. Talvez por isso, o que mais chame a atenção é a exuberância das imagens. Além dos animais, praias e demais belezas naturais, bairros como a Lapa e Santa Tereza servem como cenário e os personagens chegam a passar até por um fantástico desfile na Marquês de Sapucaí. Não podia faltar o Cristo Redentor, claro!

Ainda sobre a trama, é interessante reparar que Rio não segue o que parece ser uma tendência geral: animações que se preocupam muito com o público adulto fazendo várias referências ao mundo pop, o que a criançada deixa passar. Podemos observar algumas homenagens, como uma hilária cena que lembra o clássico Nosferatu (de 1922), mas tudo é bem simples, no geral. E o humor é acessível a vários tipos de público, de diferentes faixas etárias, deve agradar a todos. E, se pelo trailer, temos a impressão de que a trama se desenvolve rapidamente, sem períodos mornos, confirmamos isso após a sessão.

Uma campanha da prefeitura do Rio de Janeiro não traria um resultado tão bom para o turismo. O filme mostra tudo o que o estrangeiro quer ver, pode-se dizer que é o outro lado do que é visto nos dois Tropa de Elite (de 2007 e 2010) e em Cidade de Deus (2002). A favela aparece, assim como criminosos – no caso, traficantes de aves – mas o forte aqui são as cores, as belezas do Rio e a alegria que parece tomar conta de todos que estão lá. Os ritmos latinos não poderiam faltar, cortesia dos músicos contratados para cuidar da trilha: a produção executiva é assinada por Sérgio Mendes (compositor de, entre outras, Mas Que Nada, que toca no filme) e há participações especiais de Carlinhos Brown e Bebel Gilberto.

Em entrevista à revista Rolling Stone, Carlos Saldanha brinca que a equipe tentou fazer justiça ao carnaval, e não sabe se foram bem sucedidos. Há, no filme, muito realismo, proporcionado pela visita de uma equipe de seis animadores, que acompanharam Saldanha ao Rio de Janeiro. Mas um único ponto precisou fugir um pouco da realidade: “Vocês já foram às praias, sabem que não posso mostrar aquilo. Estou há 20 anos nos Estados Unidos, sei como são as coisas”, explica o diretor, revelando que teve que acrescentar pano (como na cena acima) aos biquínis mostrados para não escandalizar os americanos.

Rio chega aos cinemas brasileiros na próxima sexta-feira sem grandes concorrentes, o que deve garantir um ótimo número de espectadores. E Saldanha merece ser prestigiado, com ou sem 3D, mostrando novamente que é um dos grandes nomes da animação mundial. Acaba tirando um pouco o foco da Pixar, que já deve estar acostumada a receber a atenção da maior parcela do público, e aumentando a relevância dos estúdios Blue Sky, de onde ainda deve sair muita coisa boa. A próxima produção deles deve ser Ice Age: Continental Drift, mais uma continuação de A Era do Gelo.

Marcelo Seabra

Jornalista e especialista em História da Cultura e da Arte, é mestre em Design na UEMG com uma pesquisa sobre a criação de Gotham City nos filmes do Batman. Criador e editor de O Pipoqueiro, site com críticas e informações sobre cinema e séries, também tem matérias publicadas esporadicamente em outros sites, revistas e jornais. Foi redator e colunista do site Cinema em Cena por dois anos e colaborador de sites como O Binóculo, Cronópios e Cinema de Buteco, escrevendo sobre cultura em geral. Pode ser ouvido no Programa do Pipoqueiro, no Rock Master e nos arquivos do podcast da equipe do Cinema em Cena.

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