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A morte simplesmente não presta

Quem consegue (verdadeiramente) enxergar lições ou encontrar consolo diante da doença ou morte, é um felizardo

 

Tragédias são tragédias, e só! Não consigo perceber nada além disso. Não compro frases feitas nem me consolo em jargões religiosos ou pregações morais. Doenças não ensinam lições de vida, morte não traz aprendizado. Ninguém precisa da dor para aprender nada ou para mudar um mau comportamento. Hospital não é escola e túmulo não é professor. Respeito o que cada um extrai dos momentos difíceis e como reage em horas ruins, mas essa é a minha maneira de pensar.

Em eventos trágicos, como a queda do avião da Chape, sempre me vem a cabeça a força da fatalidade, do imensurável, do imprevisível. Há muito anos, em BH, um pedestre foi atropelado e morto por um caminhão de cerveja, que estacionado em uma grande ladeira perdeu o freio e foi esmagar, sem motorista, o rapaz que atravessava a rua, três quarteirões abaixo. Míseros três segundos seriam capazes de alterar o destino dele. Um xixi que tivesse feito, um elevador que atrasasse, um semáforo que fechasse.

Em Salvador, também tempos atrás, um tijolo despencou de uma obra e matou um pedestre. Dois segundos, adiante ou atrás, e a vítima estaria viva. A mãe de um queridíssimo amigo faleceu em um acidente de carro, quando um motorista bêbado atravessou o canteiro central e colheu seu táxi na contramão. De novo, dois ou três segundos fizeram a diferença. E posso continuar a colacionar histórias e mais histórias, trágicas ou felizes, em que a imparcialidade do tempo decidiu tudo.

Assisti há pouco, um vídeo dos últimos segundos do jogo que definiu a passagem da Chapecoense para a final da Copa Sul-Americana, na Colômbia. Uma defesa “milagrosa” do goleiro Danilo impediu a derrota da Chape e sua consequente eliminação. Naquele momento, Danilo proporcionou uma alegria inexplicável aos torcedores, mas também estava selando, definitivamente, seu próprio destino. Eu, como torcedor aficionado de um clube, o Atlético Mineiro, não pude deixar de me lembrar de um momento semelhante, quando em 2013 o goleiro Víctor defendeu um pênalti, também nos últimos segundos, e levou o Galo adiante na Copa Libertadores.

O Víctor está vivo, eu — que viajei para todos os jogos do Atlético naquela conquista — estou vivo, meu irmão e meus amigos que me acompanharam estão vivos. O destino do Víctor e aqueles derradeiros segundos nos foram generosos. A fatalidade, que matou Danilo e seus companheiros, não nos escolheu naquela ocasião. A isso, dá-se o nome “imponderável”. E este, sim, ensina, ao contrário da tragédia.

Ensina, meus caros, o quanto somos frágeis perante a relação vida vs. morte. Ensina o quanto somos insignificantes perante todo o mundo e nosso cotidiano. Ensina que alegria e tristeza são sentimentos relativos, individuais e completamente subjetivos. Ensina que não há segurança que nos segure ou proteção que nos proteja. Ensina, finalmente, que para morrer basta estar vivo. Mas disto já sabemos todos, não é verdade?

A morte não traz absolutamente nada. Só dor.

Ricardo Kertzman

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