Almodóvar critica a guerra em Mães Paralelas

O mais recente trabalho do diretor Pedro Almodóvar invadiu as casas através da Netflix e traz mais uma história com uma mãe como protagonista. Duas, na verdade. A novidade é a carga política de Mães Paralelas (Madres Paralelas, 2021), que volta na Guerra Civil Espanhola para criticar as atrocidades das disputas da época.

Seguindo a linha do longa anterior do espanhol, Dor e Glória (2019), este novo é menos espalhafatoso que outras obras do diretor. Infelizmente, é menos coeso também, já que joga muitas pontas e falha em amarrá-las de maneira satisfatória. Começamos acompanhando a rotina de Janis (Penélope Cruz, de Dor e Glória), uma fotógrafa que tem um trauma: conseguir enterrar o bisavô, morto nos conflitos da guerra civil que, estima-se, levou mais de 500 mil cidadãos.

Ela conhece o coordenador de uma instituição responsável por escavar covas anônimas e dar algum conforto às famílias dos desaparecidos. Arturo (Israel Elejalde) se interessa pela causa – e pela cliente. A partir daí, a trajetória de Janis acaba cruzando com a de Ana (Milena Smit), e as duas mães de primeira viagem terão muitas questões a resolver.

Há pontos da história de Mães Paralelas mal explicados e não explorados que devem deixar dúvidas na cabeça do espectador. O também roteirista Almodóvar parece mais preocupado em criar problemas que resolvê-los, escrevendo bons diálogos que tentam compensar a falta de substância. A fotografia e a montagem, que mais lembram uma novela de Manoel Carlos, criam um desconforto nada interessante. Não à toa, a única indicação ao Oscar que o filme emplacou foi Melhor Atriz, para a sempre ótima Cruz.

O mais interessante fica no enfoque da Guerra Civil Espanhola e na forma como ela causou traumas no país. A Espanha foi dividida entre forças progressistas, de esquerda, e conservadoras, de direita, como o grupo militar de Francisco Franco, ditador que veio a ocupar o governo por mais de trinta anos e causar incontáveis assassinatos. Um desses grupos de direita era a Falange Espanhola, responsável pela execução do bisavô da protagonista.

O mais chocante em Mães Paralelas é o fato de Janis sempre anotar telefones em pedaços de papel, ao invés de mandar o contato ou ditar o número para o outro gravar na agenda do celular. Piadas à parte, é um filme bem atuado, com destaque também para Smit, além de Cruz. E temos, no elenco de apoio, as ótimas Rossy De Palma e Aitana Sánchez-Gijón. É uma obra menor na carreira de Almodóvar, ao contrário do anterior, mais autobiográfico. Mas um Almodóvar menor ainda é melhor que muita coisa que temos por aí.

O diretor apresenta seu elenco principal

Sobre Marcelo Seabra

Jornalista e especialista em História da Cultura e da Arte, é atualmente mestrando em Design na UEMG. Criador e editor de O Pipoqueiro, site com críticas e informações sobre cinema e séries, também tem matérias publicadas esporadicamente em outros sites, revistas e jornais. Foi redator e colunista do site Cinema em Cena por dois anos e colaborador de sites como O Binóculo, Cronópios e Cinema de Buteco, escrevendo sobre cultura em geral. Pode ser ouvido no Programa do Pipoqueiro, no Rock Master e nos arquivos do podcast da equipe do Cinema em Cena.
Esta entrada foi publicada em Estréias, Filmes, Homevideo e marcada com a tag , , , , , , , , . Adicione o link permanente aos seus favoritos.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *