La Vingança é uma divertida viagem à Argentina

por Kael Ladislau

A comédia é uma zona perigosa. Aquela máxima de “até onde vai o humor” tem respostas das mais diversas e, muitas vezes, estúpidas. Longe dessa celeuma, alguns nomes e obras se arriscam a realizar um humor sagaz e de fato engraçado, sem apelar para a ofensa. Um ótimo exemplo pode ser encontrado em La Vingança (2016), filme brasileiro-argentino dirigido por Fernando Fraiha.

O longa conta a história de Caco (Felipe Rocha), um dublê que está em vias de pedir Júlia (Leandra Leal) em casamento. No dia do pedido, Caco encontra a namorada com outro. Um argentino. Para ajudá-lo a sair da fossa, o amigo Vadão (Daniel Furlán) resolve levá-lo à Argentina para “se vingar”, ficando com o máximo de mulheres possível. Argentinas.

Com essa premissa meio besta, o filme é um grande road movie com os dois personagens percorrendo de São Paulo a Buenos Aires a bordo de Opala 72, o Jorge, e se metendo em algumas confusões além da fronteira. Ainda que possa parecer mais um filme sobre o universo masculino recheado de misoginia e machismo, a obra consegue encontrar o tom quase perfeito do humor, aquele que não se preocupa em ofender, mas sim em brincar com as situações.

Isso se deve muito a Furlán. O ator, muito popular graças ao sucesso de Choque de Cultura (em que vive o motorista Renan), parece fazer o mesmo personagem de outras coisas conhecidas pela turma da TV Quase (a trupe do Choque). O que não chega a ser um problema. Vadão é o típico amigo babaca, mas que consegue tirar sarro da situação com um humor natural e um sarcasmo bem ácido, que lhe é bem peculiar. Ele consegue divertir com situações inusitadas, e sempre se dá mal.

Já Caco se remói pela descoberta da traição e se pergunta se vale a pena mesmo aquela aventura. Mais contido que o parceiro e vendo a enrascada em que se meteu, vive numa falsa esperança de ficar novamente com a (ex) amada. De coadjuvante, merece atenção Constanza (Aylin Prandi), uma cantora argentina meio hippie que a dupla encontra ao longo do caminho e que acaba tirando os dois do sério (ou o contrário).

Como o nome entrega, La Vingança brinca com a rivalidade Brasil x Argentina. Em algumas horas, essa tônica se excede e fica repetitiva – com os personagens insistindo na discussão “quem foi melhor: Pelé ou Maradona”. Não chega a cansar, mas emperra em determinados momentos.

O formato road movie é bem trabalhado. Conta com diferentes cenários e cidades, time lapses que ditam o ritmo da jornada e com personagens variados, em boa parte argentinos e que, com seu espaço, conseguem dar uma dinâmica interessante à obra. Isso resulta em situações que fazem o público rachar de rir. Os diálogos rápidos trazem pérolas que surpreendem.

A trilha merece uma atenção especial. Plinio Profeta consegue conversar o tempo inteiro com a obra como um todo. Faz um ótimo uso do clássico Raindrops Keep Falling on My Head (de B. J. Thomas, trilha de Butch Cassidy and the Sundance Kid, 1969), sem parecer piegas, e emprega uma trilha instrumental com uma pegada Ennio Morricone que dá um clima de vingança meio western, que casa muito bem com o argumento do filme.

La Vingança é uma mistura hermana em um road movie bem feito, uma trilha impecável e piadas que podem fazer chorar de rir, quando bem dosadas, sem parecer ofensivo. E o melhor: está disponível na Netflix. Vale o garimpo!

Jorge, o Opala, é um dos personagens da comédia

Sobre Marcelo Seabra

Jornalista e especialista em História da Cultura e da Arte, é atualmente mestrando em Design na UEMG. Criador e editor de O Pipoqueiro, site com críticas e informações sobre cinema e séries, também tem matérias publicadas esporadicamente em outros sites, revistas e jornais. Foi redator e colunista do site Cinema em Cena por dois anos e colaborador de sites como O Binóculo, Cronópios e Cinema de Buteco, escrevendo sobre cultura em geral. Pode ser ouvido no Programa do Pipoqueiro, no Rock Master e nos arquivos do podcast da equipe do Cinema em Cena.
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