por Marcelo Seabra
Em abril de 2009, piratas somalianos tomaram um navio cargueiro americano e acabaram levando o comandante como refém. Essa é a história que acompanhamos em Capitão Phillips (Captain Phillips, 2013), novo longa do diretor Paul Greengrass que consegue ser tão tenso quanto Voo United 93 (United 93, 2006), com a diferença de que não foi necessário ter tanta imaginação, já que o livro do próprio Richard Phillips (coescrito com Stephan Talty) serve como base para o roteiro. O outro ponto forte da produção atende pelo nome de Tom Hanks, em mais uma bela interpretação numa carreira tão marcante.
A história de Phillips e do seqüestro do cargueiro Maersk Alabama é envolta em discórdia, membros da equipe do capitão chegaram a procurar a imprensa para desmentir a saga heróica que ele teria vivido. Foi dito que ele era um sujeito egoísta e arrogante que não se importava com a tripulação e os levou direto para a área que vinha sofrendo ataques, mesmo tendo sido repetidamente alertado. Alguns dos profissionais estão até na justiça, buscando compensação financeira pelo episódio vivido, alegando que a falta de segurança no navio foi uma falha consciente da Waterman Steamship Corp. Os engenheiros Mike Perry e John Cronan chegaram a afirmar à CNN que Phillips parecia querer ser tomado como refém, por ter conhecimento do risco e insistir em passar perto da costa da Somália, contra as recomendações.
Independente da discussão do mundo real, o filme é mais uma demonstração do bom Cinema de Greengrass. A exemplo de seu primeiro longa, Resurrected (1989), que acompanhava um soldado em uma jornada épica de volta para casa, o diretor se interessa por mostrar um grande feito de uma pessoa comum em uma situação extraordinária. Equilibrando a ação entre os pontos de vista dos americanos e dos somalianos, ele eleva o nível da tensão a um ponto que parece que o público está na mesma situação a que está assistindo. Como em United 93 e até em Domingo Sangrento (Bloody Sunday, 2002), conhecer os fatos não diminui em nada o impacto do final. O percurso é o que importa para Greengrass, e a câmera nervosa de Barry Ackroyd (também do United 93) percorre todo o espaço com tamanha urgência que só nos resta acompanhá-la.
Ganhador de dois Oscars e quatro Globos de Ouro, para ficar nos prêmios mais famosos, Tom Hanks consegue o feito de viver um papel que não nos remete a nenhum outro de sua vasta galeria. Para um ator tão conhecido, conseguir fazer o público se desligar dele e ver o personagem é algo a se comemorar. E ele vai mais longe: consegue fazer do Capitão Phillips uma pessoa de verdade, e não um clichê ambulante, um erro que o roteiro de Billy Ray (de Jogos Vorazes, 2012) o ajuda a evitar. Os estreantes somalianos também ajudam no quesito credibilidade, compondo um elenco competente de rostos desconhecidos.
Independente da verdade por trás dos fatos e das acusações de servir como propaganda para o Governo Obama, com a criação de um herói que eleve a moral dos norte-americanos, Capitão Phillips é uma obra construída de maneira impecável, que nos faz lamentar o fato de Greengrass ultimamente dar um intervalo de três anos entre suas realizações. Resta-nos esperar pela próxima, que infelizmente deve passar longe da série de Jason Bourne, mas certamente terá uma qualidade ímpar.
Inadmissível sua crítica não mencionar a atuação do Barkhad Abdi. Humpf hehehe
Gostaria de ter lido algo sobre a situação sociopolítica que o filme levanta, e qual era sua opinião a respeito. Você não fez nenhuma menção disso. =)