por Marcelo Seabra
Com a aproximação da estreia do novo longa do Homem de Aço, marcada no Brasil para 12 de julho (um mês de atraso em relação aos EUA), um misto de ansiedade e receio toma conta. Não deveria, mas como evitar? Sabemos que quanto mais expectativa um projeto cria, maior é a possibilidade de seu público se frustrar. É inevitável que algo dessa magnitude seja cercado de especulações, medos e, acima de tudo, esperança. Afinal, foi o filme de 1978 que abriu as portas para essa enxurrada de adaptações de histórias em quadrinhos que temos hoje, ou que ao menos permitiu aos grandes estúdios vislumbrarem o potencial deste tipo de personagem.
Os problemas que marcaram a produção de 78 já fazem parte do anedotário do Cinema. Várias trocas de roteiristas e diretores, uma grande indecisão com relação ao protagonista, se seria alguém já estabelecido ou um novato, a dificuldade de criar os efeitos visuais necessários etc. A escolha de Christopher Reeve se mostrou fundamental. O carisma do ator era enorme, além da competência ao viver dois indivíduos distintos: o poderoso e indestrutível salvador da humanidade e o jornalista boboca que está sempre sendo deixado para trás. O sucesso foi tanto que marcou Reeve, que não ficou famoso por nenhum outro trabalho, e acabou repetindo o papel até o vergonhoso Superman IV (1987), que ele alegou ter aceitado devido ao importante tema da paz.
Apesar do que havia sido planejado inicialmente, o primeiro Superman não seguiu a linha camp, ou brega. Richard Donner, ao assumir a direção, descartou tudo e convocou Tom Mankiewicz para reescrever o roteiro, bolando logo a trama para dois filmes. Quando estava com 75% do segundo filmado, Donner parou o processo e finalizou o primeiro, quando foi demitido pelo produtor Alexander Salkind. O segundo foi finalizado por Richard Lester, que assinou a direção e cometeu ainda o terceiro filme. A diferença entre o que Lester e Donner fizeram é clara. O segundo filme começa com uma introdução muito original e inventiva que situa o espectador que não havia assistido ao primeiro, algo que é comum hoje em sequências. O terceiro, no entanto, recorre a uma série de trapalhadas e confusões, num estilo pastelão na contramão dos episódios anteriores. Contratar Richard Pryor para um papel importante já era um indicador de que as coisas iam para o espaço.
Há situações, nesse terceiro, que chegam ao ridículo. A luta entre Clark e Superman, que parece ter ficado bêbado e mau com uma kriptonita estragada, é de dar pena. Só não é pior pela dignidade conferida por Reeve, que em momento algum deixa de se levar a sério. Ele tem a oportunidade de viver alguém cafajeste e maligno e se sai bem. Isso, até Clark ter o terno derretido pelo mesmo ácido que nem molha o uniforme do herói, que está sempre intacto. No segundo filme, é possível ver sangue em várias cenas, como na interessante briga no bar. Mas a briga se conclui com uma idiota cadeira giratória. E Lois convenientemente esquece tudo que sabia com um beijo. Uma boa proposta do terceiro é colocar Lana Lang no caminho de Clark, mostrando que há mais mulheres no mundo além de Lois. E, ao contrário da jornalista, Lana se apaixona por Clark, e não pelo Superman. Mas, ao final, ela simplesmente é deixada de lado.
No quarto filme, temos novamente o mala Luthor bolando planos igualmente malas. Ele chega ao ponto de criar um “Homem Nuclear”, um dos piores vilões da história do Cinema. Depois de um salto de quase vinte anos (de 1987 para 2006), necessário para apagar esse constrangimento, tivemos uma nova aventura do Super-Homem no Cinema. Outra decepção! A escolha de Bryan Singer como diretor parecia promissora, e Brandon Routh poderia ter sido outro Christopher Reeve – ele foi escolhido inclusive por sua semelhança física com o falecido. Pena que suas qualidades vinham no singular. Mais para modelo que para ator, Routh ainda foi prejudicado por um roteiro ridículo, novamente trazendo Luthor como um vilão cômico planejando ficar rico com terrenos valorizados. A Lois de Kate Bosworth não ajudou em nada, de tão inexpressiva, e ainda arrumaram um impossível superfilho.
Com um início tão brilhante, com acertos que fazem qualquer falha sumir, a carreira do Super-Homem merecia um futuro melhor. A balança já conta três a dois no quesito qualidade e este novo Homem de Aço representaria um empate, o início de uma reerguida. Algumas críticas já divulgadas lá fora não são muito animadoras, indicando fatores negativos como religiosidade forçada, falta de leveza e desmedida influência do efeito “Cavaleiro das Trevas”, o que era totalmente desnecessário para um personagem que representa o oposto de Batman. Independente das evidências, a criança interior continuará torcendo pelo herói, até ser tarde demais.
Criar expectativas sobre obras de diferentes mídias pode ser o fiel da balança entre gostar ou não do que pode vir a ser um deslumbre ou uma decepção. Por mim, tenho tentado evitar ver os últimos trailers e ler críticas e notícias para ter uma experiência cinematográfica “pura” ao adentrar a sala de cinema. Fazendo um adendo ao que foi dito acima, muitas notícias (e delas li apenas o título e uma breve descrição para não me deixar “contaminar”), diz-se que o filme havia se pagado antes mesmo da pré-estreia, que se fosse bom (e muitas críticas apontam sua superioridade ao filme de 2006 tanto em narrativa quanto em atuações) poderia ser o estopim para uma sequência e para o tão esperado e combalido filme da Liga da Justiça e dos demais heróis da DC, que os nomes de Zach Snyder e David Goyer estão emparelhados ao de Christopher Nolan em analogia ao que este fez com a trilogia do Batman e que Joss Whedon poderá sofrer uma concorrência “amigável” nos próximos anos. Contudo, nada disto substitui a percepção particular de cada fã e entusiasta do Homem de Aço nem segura a apreensão de ver uma obra que respeite o cânone do personagem e o leve para outros patamares nesta e nas próximas gerações.