Nova animação de Tim Burton mantém o alto padrão

por Marcelo Seabra

Em 1984, quando era um animador nos estúdios Disney, Tim Burton fez um curta que foi tido como muito assustador para o público mais novo e acabou demitido. Quase trinta anos depois, o diretor lança seu Frankenweenie (2012), a versão longa daquele experimento, curiosamente produzido pelos executivos da mesma Walt Disney Pictures. Os tempos são outros e, hoje, todos querem produções sombrias que consigam agradar a uma audiência mais ampla. O fato de ser uma animação sobre um garoto e seu cachorro pode atrair crianças, mas a história, as referências e a qualidade vão trazer os adultos.

Burton já produziu duas ótimas animações em stop-motion, O Estranho Mundo de Jack (The Nightmare Before Christmas, 1993) e A Noiva Cadáver (Corpse Bride, 2005), a última também dirigida por ele. Depois de lançar os duvidosos Alice no País das Maravilhas (Alice in Wonderland, 2010) e Sombras da Noite (Dark Shadows, 2012), Burton voltou a um velho projeto e usa a técnica que já domina tão bem, fazendo a primeira animação em stop-motion em IMAX 3D e em preto e branco. O roteirista John August, em sua quinta parceria com o diretor, foi chamado para desenvolver o roteiro do curta original, de Leonard Ripps, que era baseado em uma ideia original do próprio Burton. Outro antigo colaborador do diretor, Danny Elfman, entrou em campo para criar a trilha sonora.

O protagonista de Frankenweenie é Victor, um garoto de uma cidadezinha que parece ter servido também para filmar Edward Mãos de Tesoura (Edward Scissorhands, 1990). Os colegas de escola parecem todos saídos de filmes de terror, e no entanto é Victor quem é visto como diferente. Ele não tem interesse por esportes e é muito bom em ciências, o nerd de sempre. Quando seu cachorrinho, Sparky, é atropelado e morre, Victor decide usar a lições do professor Rzykruski para trazê-lo de volta. Logo, ele vai perceber que as consequências desse ato serão grandes e desastrosas.

Os pais de Victor são bem compreensivos, daqueles que todo mundo gostaria de ter. Mas o resto da cidade não é exatamente inteligente. Os garotos da escola são extremamente interessantes, cada um com suas peculiaridades, e alguns são bem espertos. Mas os adultos, de uma forma geral, são tipos bem tapados, que agem no impulso inicial, só reforçando estereótipos. Bem no estilo dos filmes clássicos de terror, que traziam hordas de aldeões com tochas querendo queimar o monstro local, um pouco como visto recentemente também em Paranorman (2012).

Burton aproveitou a oportunidade para escancarar a paródia ao Frankenstein de 1931 e também a A Noiva de Frankenstein, de 1935. Tributos não faltam, vários monstros clássicos são homenageados, seja em cenas rápidas ou com coadjuvantes bem utilizados. Da múmia aos Gremlins, passando por Drácula e lobisomem, todos têm uma chance, e até Christopher Lee aparece. O ídolo de Burton, Vincent Price, aparece como o Sr. Rzykruski (ao lado), uma caracterização perfeita com a voz de Martin Landau, o ótimo intérprete de Bela Lugosi em Ed Wood (1994). Há, inclusive, um bichinho de estimação com o nome Shelley, apenas para lembrar Mary Shelley, a autora de Frankenstein. E Sparky tem o visual “emprestado” de um desenho produzido por Burton em 1993, Vida de Cachorro (Family Dog).

Vale reforçar que, se fosse apenas um amontoado de referências e homenagens, Frankenweenie não conseguiria um resultado tão satisfatório. Os elementos usados têm harmonia, tudo tem seu lugar e sua importância. Há momentos de humor e de tensão, bem equilibrados, e Burton mostra mais uma vez do que é capaz quando está inspirado: entretenimento inteligente que pode agradar a diferentes tipos de público. E há de se exaltar a sábia decisão dos exibidores, que disponibilizaram cópias legendadas, para quem não gosta de filme mutilado.

Tim Burton prestigia o lançamento de seu novo longa

Sobre Marcelo Seabra

Jornalista e especialista em História da Cultura e da Arte, é atualmente mestrando em Design na UEMG. Criador e editor de O Pipoqueiro, site com críticas e informações sobre cinema e séries, também tem matérias publicadas esporadicamente em outros sites, revistas e jornais. Foi redator e colunista do site Cinema em Cena por dois anos e colaborador de sites como O Binóculo, Cronópios e Cinema de Buteco, escrevendo sobre cultura em geral. Pode ser ouvido no Programa do Pipoqueiro, no Rock Master e nos arquivos do podcast da equipe do Cinema em Cena.
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