O fracasso do Diabo

Guilherme Scarpellini Daniel se afastou de Deus. Bebia demais, vadiava demais e de mais a mais, se metia em toda sorte de confusão. Atento às transgressões de Daniel, o Diabo encontrou nele as condições perfeitas para se manifestar. Tratou de materializar na vida do jovem infrator os seus truques imundos, seus jogos obscuros e suas tramas cheias de maldade. Uma noite dessas, Daniel dirigia bêbado. … Continuar lendo O fracasso do Diabo

Onde habitam os fantasmas

Guilherme Scarpellini Alguém precisa fazer o trabalho sujo, e Sebastião o fazia de mau humor. Limpar os banheiros da rodoviária certamente não é o tipo de serviço que você faz sorrindo. Com pouca saúde, quase nada de instrução e menos ainda de dinheiro, foi o que sobrou para Sebastião. Não bastasse ter de pôr a mão na merda, o maldito lugar era ainda mal-assombrado, pelo … Continuar lendo Onde habitam os fantasmas

O mistério no observatório

Guilherme Scarpellini Magricela com peito escavado, espinhas espalhadas pelo rosto, óculos de fundo de garrafa e um punhado de revistinhas da Marvel debaixo do braço. Sim, Bernardinho congregava todas as características de um nerd em um só corpo mal-ajambrado de pré-adolescente. Só por uma façanha ele se destoava dos outros meninos de sua idade: aos 13 anos, o rapaz já dirigia a caminhonete vermelha Ford … Continuar lendo O mistério no observatório

Para onde vão os gatos à noite?

Guilherme Scarpellini As luzes dos postes se acendem lá fora, e o gato Poe começa a se agitar. Devora o pires de uma gororoba que fede a peixe podre, alonga o seu corpinho esguio, mia para dizer que é dono de si mesmo e pula a janela. É hora de cair na noite. A última vez que saiu de casa, passou dois dias e três … Continuar lendo Para onde vão os gatos à noite?

Léo Sequela

Guilherme Scarpellini Léo Sequela tem vinte e poucos anos e vendia trouxinhas de maconha na esquina quando era um pouco mais moleque. Estreou a maioridade em cana. No dia que completou 18 anos, a polícia invadiu o seu barracão, sem mandado, mas com um belo chute na porta, e encontrou um pouco de erva embalada para pronta entrega. Léo Sequela, incapaz de matar uma mosca, … Continuar lendo Léo Sequela

Dia do Rei

Guilherme Scarpellini Li que o governo brasileiro cogitou trazer o coração de Dom Pedro I, que está preservado em formol e guardado em uma igreja de Portugal, para as comemorações do bicentenário da Independência. O que me levou a recordar a história do povo de São Benedito do Padecimento, um pequeno povoado na divisa com o fim do mundo, onde as antigas tradições são firmes, … Continuar lendo Dia do Rei

Assassinatos em vida

Guilherme Scarpellini Nunca uma questão havia tirado o sono de Jorge como esta: como matar a mulher com quem dividiu o colchão, o espaço na frente do espelho do banheiro e até mesmo a torrada no café da manhã, ao longo dos últimos cinco anos? Jorge não fazia ideia de como deveria proceder. Mas sabia que tinha de fazê-lo por uma via rápida, indolor, eficiente … Continuar lendo Assassinatos em vida

A última refeição

Guilherme Scarpellini Dois ovos mexidos são indispensáveis no café da manhã de Décio. Ele apanha sempre os mais graúdos na porta da geladeira, quebra a casca na quina da frigideira e despeja clara e gema na manteiga quente. Foi justamente ao quebrar o ovo pela manhã que Décio quase morreu de susto. Lá dentro não havia clara nem gema, mas um filhotinho de réptil. Isso … Continuar lendo A última refeição

Um olho

Guilherme Scarpellini Vejo a noite ficar mais escura à medida que as horas vão passando. Depois, o inverso. Às 8 da manhã, o dia está claro suficiente para machucar os olhos de quem varou madrugada adentro, trabalhando em uma lojinha de merda, dentro de um posto de gasolina 24 horas, igualmente, merda. É hora de ir para casa. Parece que o corpo humano não foi … Continuar lendo Um olho

Fantasma na janela

Guilherme Scarpellini Era algo como uma presença, uma entidade, uma energia estranha que Alfredo sentia ao descer do carro para abrir o portão, sempre que chegava tarde da noite em casa. Assim que se voltava para o carro, o rapaz avistava, de relance, sob a penumbra de uma luz fraquinha, envolta pelas cortinas brancas da pequena janela da casa do outro lado da rua, Dona … Continuar lendo Fantasma na janela