Chocolate

Peter Rossi

Tomava um café com um velho novo amigo e nessas voltas sem sentido que toda conversa dá, esbarramos a falar sobre comida. Junto, uma amiga comum, vegana, fingindo ser vegetariana.

Vários foram os sabores compartilhados, ainda que na imaginação, regados a goles de um café bem mais ou menos. A chuva nos impelia a ficar quietos e assim quedamos. Preguiça de botequim, daquelas em que a gente amolda na cadeira e não tem mais vontade de sair.

A conversa, muito boa, as pessoas melhores ainda. Como é bom desfrutar de um papo reto, de companhia boa, sem se preocupar que o mundo nos espera lá fora, com a mesma celeridade de sempre. Vagarosamente iremos recuperar o ritmo, mas não nos deixamos levar pela intempérie e o solavanco. Vamos passo a passo, e nessa caminhada não nos esqueçamos nunca que conversar com pessoas agradáveis é das melhores oportunidades.

Enfim, falava de nosso tema sobre a mesa: a comida. Tudo começara com a brincadeira de sempre, sobre o porquê de ser vegetariano. Elenquei, de forma até desesperada, dezenas de motivos a justificar para minha amiga que a premissa é absolutamente injustificável. Que me perdoem os vegetarianos, não lhes sou boa companhia à mesa.

Comida é um negócio muito sério, que já impulsionou a economia mundial e movimentou nações inteiras. Pessoalmente, não acredito que alguém buscaria o caminho para as Índias atrás de folhas de alface!

Conversa vem, conversa vai e chegamos a um ponto comum – o chocolate! Ah, esse divino componente do imaginário. O chocolate que tantas lembranças e sonhos desperta!

Falamos da origem, imaginando os maias, no Golfo do México, celebrando as vitórias e oferendas aos seus deuses com largas canecas da bebida. Os caras eram bons mesmo. Falam das mil e uma coisas que eles – os maias – nos legaram e, quase sempre se esquecem da maravilha do chocolate. Portanto, meu amigo, quando viajar a Cancún e percorrer as ruínas nas redondezas, não se esqueça, da próxima vez, de penhoradamente ajoelhar e agradecer aqueles guerreiros por nos deixar essa receita, o esmagar dessa fruta que tanto nos convence, a ponto de deixar em nossa boca o indescritível gosto por longo tempo.

O chocolate é isso mesmo: ele agarra de tal forma em nossas papilas, como a forrar a língua com um majestoso tapete e não nos deixar esquecer o quanto seu gosto é bom!

Comer chocolate descansa, relaxa, nos faz lembrar que o simples ato de se alimentar pode ser um presente para a alma. É ou não verdade? Será que alguém come chocolate sem gostar? Eu, simplesmente, não creio.

Além de tudo isso, o chocolate vale o que representa, ou seja, o perfume do imaginário. Como disse antes, o chocolate é dádiva, é presente da vida. Dar um chocolate a alguém é dizer à pessoa que, antes de tudo, ela é muito importante para nós. Ao dar um chocolate, estamos externando a mais sincera vontade de quem o recebeu sorver um dos melhores momentos da vida. Entregar um chocolate pode ser até uma declaração de amor. Quase sempre é!

Ao cruzar o portão da casa da namorada com uma caixa de chocolates debaixo do braço, o rapaz se sente mais forte que é. Sabe que vai impressionar, que vai fazer bonito. Se sente até mais bonito, essa é a verdade.

E a menina? Recebendo o chocolate, penso eu, se sente beijada. O chocolate é como um beijo daqueles que deixam um doce na boca e uma inesgotável vontade de querer mais e mais.

É tão instigante essa história do chocolate e do que representa que se observarmos bem, eles nunca vêm maltrapilhos. Estão sempre vestidos para a festa. As embalagens são brilhantes, bem acabadas e causam tanto impacto quanto o conteúdo.

Chocolates são tão bons que duplicam o nosso prazer, se transformam em bombons. Já pensaram nisso? Porque bombons, e não “maisoumenosmaisoumenos”?

Bombons são chocolates em forma de flor. Embrulhados pra presente, sempre redondos, ou na maioria das vezes, a facilitar o giro em nossa boca, de um lado a outro, fervilhando de sabor a nossa vida.

O chocolate é bom companheiro. Abraça o morango e o transforma em manjar. Envolve a castanha, a uva-passa e os fazem desfilar pelo tapete vermelho de nosso melhor paladar.

Dizem que coelhos trazem chocolate. Quando menino fingia acreditar, e corria atrás de pegadas feitas a talco no chão do corredor, transmitindo a ideia de que recebera uma visita especial na noite anterior. Eram ovos de chocolate. Aí o descompasso da história: ovos de coelhos? E porque os coelhos? Brincadeiras à parte, sabemos bem que os ovos representam o renascer e que os coelhos eram símbolo da fertilidade, desde o antigo Egito. Mas qual a razão de serem de chocolate os ovos, então? Ora, porque chocolate é a coisa mais gostosa que tem…

Não acredito que existam pessoas que não gostem de chocolate. Elas se enganam, são antropofágicas do próprio desejo. Fingem que não ligam, que não estão nem aí, mas certamente se roem por dentro. Tenho certeza que adorariam receber um beijo da pessoa amada, com um gostinho de chocolate bem lá no fundo.

Eu mesmo adoro chocolate, embora tenha que brigar a todo tempo com a glicemia. Corro pros dietéticos que, ainda assim, são maravilhosos! Ou seja, o prazer de comer um chocolate é indispensável. Que bom que a medicina cuidou de entregar seus préstimos a tão importante missão: alentar os diabéticos, não os deixando à margem do mundo, mesmo porque, mundo sem chocolate é apenas projeto, maquete.

E uma boa caneca de chocolate quente? Meu Deus, como é bom! Esquenta o nosso coração e nos remete ao paraíso. É tão gostoso que devemos comer de colher, de pouquinho em pouquinho, para que o momento fique estanque, parecendo a eternidade. Chocolate quente, na caneca, é um sabor pra nunca esquecer. Agora, por exemplo, sinto na boca o gosto do chocolate da Jô e sua receita misteriosa, guardada a sete chaves. Ela está certa, o melhor é a dádiva, o prazer que seus amigos compartilham a cada gole. Eternamente gratos os amigos. Obrigado Jô.

O chocolate é tão indispensável que não cabe na dispensa, invariavelmente ficam guardados sempre numa gaveta ao alcance de nossas mãos. Quando menos se espera, esticamos o braço e tateamos a procurar um bombom e, com ele na boca, ter mais paciência com o filme que estamos vendo, ou mais atenção ao bom livro em nossas mãos.

Chocolate é tão bom que mesmo amargo … é doce! Doce como a alegria nos olhos da menina ao abraçar o parceiro e, em agradecimento, lascar aquele beijo de amor com um gosto que só o chocolate tem.

Chocolate vale por si mesmo. Sem motivo, sem razão. Chocolate é tão bom que na maioria das vezes vem com o sobrenome “eu te amo”. Ele personifica o sentimento maior. Não se faz declaração de amor com um espinafre nas mãos. Não! Amar em forma de sabor é chocolate. Olhando nos olhos da amada, esperar ansioso a felicidade que deles emana com o chocolate nos lábios com a certeza de que, naquele momento, não a poderia ter deixado mais feliz!

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