Vovó armada

Reprodução/Getty Images
Guilherme Scarpellini
scarpellini.gui@gmail.com

Vovó tem 84 anos e ainda não foi vacinada. Mora sozinha, parou de dar aulas de pintura e não pode ir à missa, como fez a vida toda. Sente falta de abraçar os filhos, netos e bisneto, e anda desanimada. Mas os seus problemas acabaram (ler com voz de Organizações Tabajara). Cidadã de bem, vovó agora poderá adquirir até seis armas de fogo de uma só vez — com direito a mira telescópica e calibre grosso.

Vovó voltará a banhar-se sob o sol da manhã todos os dias na porta de casa. E ai do vizinho que soltar os seus virusinhos de estimação para cima dela: vovó armada, que jamais será escravizada (ler com voz de genocida autoritário maluco), descerá uma saraivada de pipoco em cima deles.

Como paga os impostos em dia, vovó poderá andar por aí carregando duas pistolas na cintura, uma de cada lado. E na menor ameaça de contaminação, seja na fila do pão ou do saque da aposentadoria, não pensará duas vezes antes de abater o vírus oportunista.

Poderá, inclusive, tornar-se uma legítima caçadora de vírus, quando terá autorização para adquirir até 5 mil munições de uma só vez. Pente cheio e cinturão de balas a tiracolo, vovó, feito o “Rambo: Programado para Matar”, dará até tiro para cima, a fim de se proteger contra os monstrinhos virulentos.

Este é o Brasil em que vive a vovó. Não tem vacina, mas sobra revólver. Tudo na base do decreto, à revelia do Congresso e ao arrepio da opinião popular. E se você estiver se perguntando como um revólver pode ser útil na pandemia, meu amigo e minha amiga, eu arrisco a dizer: deve ser para enfiar no rabo dele (ler com voz do presidente da República).

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Este é o texto número 600 do blog Mirante. Daqui a 66 postagens, bateremos o número de Jair Messias Bolsonaro.

Parabéns aos envolvidos.

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