Vida longa ao Clint

 
Clint Eastwood, 90 (Reprodução/Facebook)
Guilherme Scarpellini
scarpellini.gui@gmail.com

Um melhor amigo de infância é bolsonarista, mas é meu amigo. Outro dia ele me encaminhou uma notinha de jornal, que mostrava o presidente usando uma gravata estampada de fuzis, e disparou: “é para isso que serve jornalismo?”. Ele sabia que me alfinetava com um tridente: sou jornalista (!), detesto o presidente (!!) e tenho aversão a armas e armamentistas (!!!).

Mas devo desconsiderar a última ponta desse tridente, pois abro aqui uma exceção. Sou apaixonado por filmes que têm tiros pra todos os lados, no estilo bang bang — especialmente aqueles banhados em molho ao sugo, com generosas porpetas boiando, como corpos atirados nos açudes do Novo México: são os filmes do gênero “faroeste espaguete”, cujo expoente foi o cineasta italiano Sergio Leone, nos anos 1960.

Clint Eastwood é um dos culpados por essa belicosa incoerência minha. Poucas coisas na vida me dão mais prazer do que mirar, apontar e atirar-me ao sofá, para assistir, na sequência, a “Por um Punhado de Dólares” (1964), “Por uns Dólares a Mais” (1965) e “Três Homens em Conflito” (1966) — completando a famosa trilogia do diretor italiano, com Clint no papel de mocinho.

Neste ponto é que eu começo a morrer de vergonha. Os dedos vão desobedecendo aos comandos, as faces vão corando e o coração encolhe no peito. Mas acabo por admitir: Bolsonaro também é fã de Clint Eastwood — :(.

Isso mesmo. Para o desgosto geral da nação de cinéfilos, recentemente, o presidente da Terra Plana postou no Twitter a imagem maculada de sua pessoa, afundada ao sofá, com as pernas para o alto, assistindo ao bom e velho Clint, num clássico de “faroeste espaguete” — exatamente como euzinho mesmo faço em minha casa, sendo a única diferença é que eu não sou fascista.

Tal crime de responsabilidade contra a obra de Clint Eastwood levou-me a protocolar essa crônica na Câmara dos Deputados, somando a outros 6359845 pedidos de impeachment, sobre os quais senta o presidente da Casa da mãe Joana, Rodrigo Maia, que agora assiste a toda essa balbúrdia de cima do muro, digo, mundo.

Só espero que, desta vez, em respeito à sétima arte, o homem saia de cima do meu pedido, que não tem outro motivo a não ser a própria política do país, isto é, bang bang.

A propósito, Clint completou 90 anos no último domingo, e não merecia ser lembrado assim. Vida longa ao velho Clint — e mandato curto ao presidente.

Jair Bolsonaro assiste a Clint Eastwood (Reprodução/@jairbolsonaro)

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