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Tragédia brasileira

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Guilherme Scarpellini

Desrespeitável público, 

A democracia às avessas e de ponta-cabeça, orgulhosamente, apresenta: o Brasil que você não quis, mas escolheu assim mesmo — no susto. Pois que se abram as porteiras, perdão, as cortinas do picadeiro, que o espetáculo já vai começar.
 
E começou com o presidente da República metido numa fantasia ridícula de herói da Idade das Trevas – e já podia terminar. Mas quem apareceu de espada em punho foi o ministro da Educação. 

Ele açacinava a língua portugueza (sic), como se o S fossem terríveis cobras de duas cabeças e o Ç cedilha, abomináveis monstros de boca aberta e o rabinho a balançar.

Não bastasse, o secretário da Cultura, não menos canastrão, encenava uma paródia macabra de nazismo dos trópicos. Dizia um monólogo estranho sobre coisas esquisitas que pareciam saídas de um documentário da Segunda Guerra. Mera coincidência retórica, explicou.

E ao cabo do primeiro ato do teatro do absurdo, enfim, uma pausa para fazer xixi. Pois todo mundo estava mesmo de saco cheio. Mas por esta ninguém esperava: das latrinas saiu o pedido de casamento.

A namoradinha de um Brasil acima de tudo e abaixo do fundo do poço virou noivinha da republiqueta, e casou-se com o falso herói da tragédia brasileira. Entrou vestida de verde-amarelo, véu, grinalda e brasão da CBF. E saiu com a chave da cultura nas mãos.  

Mas não qualquer cultura. Uma cultura nacional, heroica, imperativa, homofóbica, racista e outros etecéteras piores e tal. Resta agora devolver a ela o único adjetivo que interessa – livre. 

Aliás, imbuída de liberdade de expressão, a namoradinha, muito antes de ser noivinha, esteve muito bem à esquerdinha nos anos de chumbo, na década de 1970.

Pois contra a censura às telenovelas brasileiras, bateu às portas do general Geisel, em Brasília. E as portas bateram na cara dela.  

Vindo agora de quem tem a testa amassada pela repressão, vá lá, dá até uma pontinha de esperança de ver as portas abertas.

E passando livres por elas Brunas Surfistinhas, beijos cancelados, filmes proibidos, óperas de Wagner, rock and roll, batuques, mandingas, macumba e outras obras-primas do Capiroto – que, como o próprio nome indica, é democrático.

Mas não sejamos tolos. Que fechem logo as cortinas do picadeiro. Pois até quem vê Cristo em goiabeira sabe que não há grand finale em tragédia brasileira.

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