Repescagem 2017: Roda Gigante

por Marcelo Seabra

Fazendo um filme por ano, não é possível manter a mesma qualidade sempre. Já entendemos isso quanto a Woody Allen pelos últimos filmes. Para cada Meia-Noite em Paris (2011) ou Blue Jasmine (2013), temos um Para Roma Com Amor (2012), O Homem Irracional (2015) e Café Society (2016), para ficar nos exemplos mais recentes.

Mesmo os trabalhos mais irregulares do diretor e roteirista costumam ficar acima da média, mantendo um mínimo de qualidade e interesse. Daí a surpresa com Roda Gigante (Wonder Wheel, 2017), longa que consegue errar de várias formas. O problema já começa com a narração de Justin Timberlake (de Inside Llewyn Davis, 2013), um recurso cansativo e altamente dispensável. E o personagem não é onisciente, não tem como ele saber tudo o que aconteceu.

Mickey, o salva-vidas de Timberlake, já começa avisando que é um aspirante a escritor e, por isso, é altamente dramático, como se isso fosse justificativa para desculparmos as falhas de roteiro e os diálogos capengas e expositivos. E não ajuda o cantor estar com um rosto estranho, não sei se por causa de botox ou apenas maquiagem. Precisaram fazer isso para que realmente parecesse que a diferença de idade entre ele e Kate Winslet (de Depois Daquela Montanha, 2017) fosse grande.

Winslet, a protagonista, é o alter-ego de Allen, a personagem neurótica, paranoica e ciumenta da vez. E parte disso descobrimos porque ela mesma afirma, como se o público não fosse capaz de entender. Ginny é infeliz com sua situação atual, longe do requinte que o passado prometia, e a chegada da enteada (Juno Temple, de Aliança do Crime, 2015) vai dar uma sacudida nas coisas. James Belushi (de Twin Peaks) completa o elenco principal como o marido de Ginny.

A disputa de quem está mais exagerado e fora do tom no triângulo inicial é acirrada, mas o teatral Belushi leva a melhor (ou pior). Temple é a mais discreta, mas a personagem cuja história convence menos. Se você é jurada de morte em Nova York, fugiria para a vizinha Coney Island, onde o seu pai mora? Esse é apenas um dos problemas de um filme desinteressante, irritante e preguiçoso em suas soluções.

Resta saber se Allen continuará no ritmo de lançar um filme todo ano. Se for com essa qualidade, não precisa. E ele ainda se encontra em meio a acusações de assédio sexual, algo que o ronda há anos e ganhou força nos últimos dias. Alguns profissionais certamente evitarão trabalhar com ele.

Allen comanda o casal

Sobre Marcelo Seabra

Jornalista e especialista em História da Cultura e da Arte, é atualmente mestrando em Design na UEMG. Criador e editor de O Pipoqueiro, site com críticas e informações sobre cinema e séries, também tem matérias publicadas esporadicamente em outros sites, revistas e jornais. Foi redator e colunista do site Cinema em Cena por dois anos e colaborador de sites como O Binóculo, Cronópios e Cinema de Buteco, escrevendo sobre cultura em geral. Pode ser ouvido no Programa do Pipoqueiro, no Rock Master e nos arquivos do podcast da equipe do Cinema em Cena.
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